Há uma tempestade
caindo esta noite.
O vento está soprando
forte. Trovões e relâmpagos estouram a cada segundo.
E eu estou sozinha na
minha casa de dois andares.
Há duas entradas para
a nossa casa. Uma porta da frente e uma porta dos fundos, claro. Nós também temos um sótão e um porão. Nossa casa é bem
grande. Possui muitos quartos.
Mas o destino nos
odeia. Papai faleceu há muito tempo atrás. E nossa primeira casa foi consumida
por um incêndio.
Minha mãe e eu
vivemos aqui. Mas ela ainda não voltou. Espero que ela esteja bem, porque essa
tempestade está de matar.
Eu me sinto estranha
nesta noite. Estou muito preocupada com a mamãe. Espero que a tempestade acabe
logo.
Estou largada no sofá
da sala de recreação no andar de cima, assistindo televisão. Eu pego o telefone
e tento ligar para minha mãe algumas vezes, mas ela não responde. Por que ela está demorando tanto? Claro, é a
tempestade.
Eu desligo a TV e
desço para a sala de estar. Tento ligar para ela mais uma vez. Seu telefone chama. E chama. E chama.
Sem resposta.
Estou começando a
ficar com frio. O bom é que nós temos uma lareira elétrica com controle remoto.
Eu aperto o botão. Calor
instantâneo. Eu sento no braço da poltrona e espero.
A tempestade está
ficando pior. A chuva está mais grossa, o trovão ressoa violentamente.
Talvez eu devesse
fazer alguma coisa pra comer, só pra passar o tempo. Eu vou até a cozinha e abro a geladeira. O
que tem de bom? Eu devo pegar uma fatia de bolo de morango ou um pedaço de
lasanha?
As luzes de repente
se apagam. A luz da geladeira some, a lareira elétrica desliga. Tudo desliga. Não há nada além de escuridão.
Escuridão complete e absoluta.
A escuridão devora
minha casa.
A única luz que resta
é do flash ocasional de um relâmpago. E toda vez que ele explode, sinto como se
ele me atingisse. Como se ele me acertasse, o pelo da minha nuca se arrepia. Me
dá calafrios.
Estou assustada.
Nunca tive medo do
escuro, nem de trovão ou relâmpago, ou de estar sozinha com tudo isso. Já aconteceu comigo uma vez. Eu era criança na época.
Eu só esperei. Como estou fazendo hoje. E
você sabe o que aconteceu? Mamãe chegou. Ela veio até mim quando eu era uma
garotinha de nove anos. Agora
ela fará isso novamente. Eu sei que ela vai voltar.
Eu corro escada acima,
tropeçando algumas vezes. Eu nunca sou cuidadosa. Aproveitando a luz do
relâmpago que brilha lá fora, eu chego até o meu quarto para pegar a lanterna
de emergência que escondi ali no armário.
Está ficando mais
frio.
Eu desço para a sala
de estar de novo, agora armada com uma lanterna. Ela ainda não está aqui. Por que? Eu olho para o
relógio. Caramba! Já são 23h00!
Eu devia ligar pra
ela outra vez? Agora estou realmente preocupada com ela. Agora estou com medo. Estou assustada por ela.
Uma vontade repentina
me assola. Eu quero sair e procurar por ela.
Mas talvez ela esteja
perto. Ela deve estar lá fora. Eu deveria ir vê-la.
Eu corro para a porta
da frente, abro-a e vejo um céu escuro pairando sobre mim. Eu olho ao redor. Nada da mamãe. Tudo
que eu vejo é um espaço vasto, preenchido com grama molhada e algumas árvores.
A estrada fica à esquerda. O vento gelado me dá arrepios e o frio penetra nos
meus ossos.
Um estrondo ressoa
das nuvens. É tão forte que momentaneamente ilumina todo o lugar, fazendo
parecer dia por uma fração de segundo. Eu vi algo durante o flash, ou alguém,
parado entre as árvores.
Quem era? Mamãe?
Eu forço a visão,
tentando inutilmente usar minha lanterna, como se sua luz fraca fosse me ajudar
a enxergar na vasta escuridão.
Outro brilho de um relâmpago.
E a casa inteira
volta à vida. A energia voltou. Parecia o natal, com todas as luzes da casa
acesas.
Eu olhei entre as
árvores de novo e o vi. Não
era mamãe. Era outra pessoa. E ele estava correndo na minha direção, bem rápido.
Ele corre como louco. Corre como se tivesse acabado de fugir da prisão.
Meu coração bate
violentamente enquanto minha mente fica em branco. Ele está chegando perto. O
que eu devo fazer?
Eu vejo algo
brilhando em sua mão e percebo o que ele está segurando. Era uma faca, grande e
mortal.
Eu grito quando
recobro o controle do meu corpo. Eu bato a porta quando ele está a alguns
centímetros da varanda e a tranco.
Eu não sei o que
fazer em seguida.
Ele chuta a porta bem
forte. O som me lembra do trovão.
Eu grito novamente.
O que eu devo fazer?
Ele chuta de novo. Eu grito mais alto.
Nada vai acontecer se
eu simplesmente ficar parada aqui, esperando pra ser empalada.
Eu corro pro porão.
Olho ao redor, procurando freneticamente por alguma coisa. Qualquer coisa.
Eu nem sei o que
estou procurando.
Eu escuto de novo. Ele quer entrar. Está
sedento por matança.
E se eu disser a ele
que eu vou ligar pra polícia? Isso
o assustaria? Talvez seja tarde demais. Eu começo a entrar em pânico. Eu preciso
seguir o meu plano.
Eu vejo a arma
perfeita. Um pé de cabra. Eu o
apanho. Eu
devo voltar pra sala de estar e esperar que ele arrombe a porta? Não, isso é suicídio. Eu vou só me esconder
aqui. Além do mais, não é fácil derrubar aquela porta.
De repente, ele pára
de bater na porta. Por que ele
parou? Ele desistiu? Talvez. Espere. Não. A porta dos fundos!
Eu disparo escada
acima, esperando que não seja tarde demais. Eu seguro minha arma firmemente. O
que quer que aconteça, estou pronta. Pelo menos é o que digo a mim mesma. Eu
corro pela sala de estar e atravesso a cozinha. A chuva continua piorando e o
vento domina minha audição.
E eu paro
abruptamente.
Lá está ele, parado sob
o batente. Como eu temi, ele veio pela porta dos fundos. Está molhado,
provavelmente congelando. Sua estatura alta faz sua sombra cobrir o cômodo
inteiro. Em sua mão, a faca reluz.
Trovão e relâmpago
ressoam, desligando a força novamente.
"Olá", ele
diz.
"Se
afaste!" eu grito, com toda a minha força. "Eu disse pra ir
embora!"
Ele se lança na minha
direção, de forma rápida e mortal.
Eu balanço o pé de
cabra, mas o movimento é interrompido. Ele o segurou. E agora vai me esfaquear.
Eu largo o pé de
cabra e me afasto dele o mais rápido que posso. Ele me alcança, agarra meu
cabelo e me prende no chão.
Eu grito de dor
quando ele me bate.
Acabou. Estou morta.
Mas não posso
desistir. Pela minha mãe.
Eu chuto forte e
tenho sorte de acertar sua virilha.
Ele geme e me xinga.
Eu aproveito a oportunidade pra correr escada acima, direto pro meu quarto. Foi
até engraçado, porque eu não tropecei nenhuma vez.
Eu fechei e tranquei
a porta. O que eu deveria fazer agora? Eu desabo no chão, sem esperança. Eu
tremo como nunca tremi antes.
Um relâmpago brilha novamente. Eu grito. Eu
nunca gritei por causa de relâmpagos antes. A chuva está ficando mais fraca
agora. Eu também começo a me recompor, a juntar os pedaços. Eu respiro fundo e olho ao redor. Eu ainda preciso me
proteger.
Droga, eu esqueci de
guardar armas mortais no meu quarto.
Então eu o ouço me
chamando. Posso ouvir seus passos subindo as escadas.
"Saia,
bebezinho", ele diz, com sua voz macabra. "Eu não vou te
machucar".
Eu tento me manter
calma. Não grite. Mantenha a
cabeça fria.
Eu encontro o meu
telefone. Eu não acho que ele vá me ajudar agora, mas o que eu tenho a perder? Eu disco 911. O telefone toca. Eu
escuto uma resposta, mas meu telefone de repente fica mudo. Ah, ótimo.
Toc, Toc.
Ele está do lado de
for a do meu quarto. Psicopata dos infernos.
"Vamos querida,
eu sei que você está aí."
Eu quase vacilo.
"Garotinha,
garotinha, me deixe entrar", diz o maníaco.
"Vai se
foder!" eu respondo, com raiva.
Eu ouço sua fúria
enquanto ele tenta derrubar a porta. Minha porta não é tão forte quanto a da
frente. Ele chuta de novo.
Eu mantenho a boca
fechada, mas minha mente grita de terror. O relâmpago reluz novamente. Eu o ouço chutar de novo.
Então eu ouço um som
diferente. Algo com o qual sou familiar. Algo que me faria muito bem em ouvir,
mas dessa vez faz meu sangue congelar.
É minha mãe. "Susan? Susan, onde você está?"
E tenho certeza que
ele ouve também.
"Não! A minha mãe não! A MINHA MÃE
NÃO!"
Eu o escuto correndo
escada abaixo.
Corajosamente, eu
abro a porta e corro atrás dele. Mas ele já está fora de vista. Estou tão assustada. E tão irada. Descer as escadas
demora uma eternidade. Parece nunca acabar.
Eu chego ao final e
vejo. Ele está em cima dela. Está esfaqueando ferozmente.
Esfaqueando. Esfaqueando.
Esfaqueando. Esfaqueando. Esfaqueando. Esfaqueando.
Minha mãe jaz ali,
imóvel. Seu sangue inunda o chão.
Eu não consigo
suportar isso. Estou tão aturdida que esqueço como sentir. Ele se vira pra mim. "Sua vez".
Eu corro pra cozinha
e me viro pra ver o quão perto ele está.
Está bem perto.
Ele é tão determinado.
É imparável.
E vai me pegar.
Eu corro mais rápido.
Tento sair pela porta dos fundos quando sinto algo frio cortar golpear minhas
costas.
Ele me cortou.
Eu pego a primeira
coisa que estava ao meu alcance e arremesso contra ele. Era uma frigideira. Não surte efeito nenhum nele. Ele
me pega pelo pescoço e me joga no chão.
"Não se
preocupe, eu ainda não vou te matar. Vamos brincar primeiro".
Oh, não, por favor.
Ele se ajoelha diante
de mim e arranca minhas roupas como um animal selvagem. Estou morta. Estou condenada.
Ele morde meu ombro.
Depois minha orelha.
E ele está tentando
entrar em mim.
Não há esperança.
Estou desistindo.
Aceito meu destino.
Mas não.
Não.
Minha mãe não ia
querer que isso acontecesse.
Eu olho ao redor
freneticamente. Ali está o porta-faca.
Não tenho mais nada a
perder. É isso ou morrer sem esperança.
Eu olho pra ele
direto nos olhos. Eles eram
verdes. Olhos verdes e furiosos.
Eu mordo seu nariz. Ele grita. Eu mordo
mais forte, até sangrar. Eu agarro seu pênis e puxo com força. E então o acerto
com o meu joelho. Me aproveitando do choque dele, me levanto e corro para as
facas.
Ele segura meu tornozelo. Esfaqueia
minha perna e eu caio.
Estou muito nervosa
para sentir qualquer coisa.
Eu pulo na direção
das facas e elas caem no chão. Eu pego uma aleatoriamente e enfio no olho dele.
Ele rola e cai de costas, mas não solta minha perna. Eu pego outra faca e
cortou seu pênis fora.
Ele grita bem alto,
como uma garotinha.
Sabendo que ele não
tem forças pra reagir, eu sento em cima dele.
Eu esfaqueio.
Esfaqueio. Esfaqueio.
Esfaqueio. Esfaqueio. Esfaqueio.
Eu paro. Ele está morto agora.
Eu penso na minha
mãe. Ela era a minha única família. Eu me lembro do que ele fez a ela.
Eu olho para o rosto
dele.
O que antes era seu
olho esquerdo, agora não passava de uma órbita vazia.
Eu me sinto
esquisita. É a sensação mais estranha de todas.
Isso era...
Diversão.
Satisfação.
Prazer.
O relâmpago brilha novamente.
Eu pego sua faca
grande e a seguro com firmeza.
Preciso de mais.
Eu esfaqueio seu
corpo morto de novo. E de novo.
Esfaqueio. Esfaqueio. Esfaqueio.
Esfaqueio...