sábado, 28 de setembro de 2013

Oprimida


Eu cresci em uma cidadezinha bem calma, chamada Dureyham. Todos conheciam uns aos outros, e havia uma linda floresta ali perto, onde eu morava em uma cabana de madeira. Eu vivia com o meu pai, pois minha mãe havia morrido durante o meu parto. Eu sempre carregava essa culpa comigo, pelo fato da minha existência ter causado o fim da existência dela. Devido às circunstâncias, meu pai e eu tínhamos um relacionamento muito próximo.

Desde que eu me lembro, nunca socializei muito com as crianças da cidade e nem tinha vontade. Eu era evitada pelas outras crianças da minha vila. Depois eu compreendi que isso se devia, sem dúvida, á situação da minha família. E, naquela época, era bizarro pra uma criança da minha idade crescer com apenas com um dos pais, principalmente com um pai solteiro. Essa talvez fosse a razão do porque meu pai e eu morarmos na floresta ao invés da própria vila, parcialmente isolados da pequena sociedade. Eu me lembro de uma vez em que um garoto se aproximou de mim e bufou, “minha mãe diz pra mim ficar longe de você. Ela diz que a sua família não é correta.” Sendo uma criança de seis anos, fiquei perplexa com essa afirmação, além de confusa e sem saber o que significava e por que ele havia dito aquilo. Eu dei de ombros e continuei a atirar pedras pelo playground, solitária.

Quando eu tinha uns sete anos, uma colega de classe, Sarah Potts, desapareceu. Tudo que eu me lembro da Sarah é que seu cabelo loiro, quase branco, estava sempre preso em dois rabos de cavalo, dos dois lados da cabeça, e enfeitado com laços de cetim brilhante, e que ela tinha olhos azuis. De vez em quando, durante a aula, ela olhava pra mim da sua carteira, cochichando com as suas amigas e rindo, e depois voltava a olhar pro seu caderno. Mas eu já estava acostumada a ser ignorada. Mas tudo isso era uma ocorrência bastante estranha para a nossa singular e pacata cidade. Os vizinhos conversavam uns com os outros diariamente, e as crianças brincando na rua eram sempre vigiadas, então os pais não tinham motivo para se preocuparem. Isso foi até alguns dias depois do desaparecimento da Sarah, quando as equipes desesperadas de busca desanimaram e a cidade chegou à mórbida conclusão de que qualquer esperança em encontrar sua garotinha seria fútil.

A comunicação entre os moradores decaiu. As crianças estavam proibidas de brincar na rua, e não se viam crianças sem os pais por perto. Dureyham se tornou uma cidade fantasma. Eu andava sozinha pelas ruas escuras da cidade na minha volta pra casa, triunfante, como qualquer criança estaria, pelo fato de que agora eu tinha toda a cidade pra brincar, sem ter que enfrentar o tormento freqüente que eu sofria nas mãos das outras crianças.

Eu abri a porta de madeira e andei até a cozinha, onde meu pai estava preparando a refeição. Eu fiquei com água na boca, ansiosa e faminta. Eu não havia comido nada o dia inteiro de novo, pois as crianças da cidade, como sempre, tinham roubado meu almoço.

“Sente-se, querida”, meu pai sorriu. Eu pulei em uma cadeira de madeira meio oscilante, lambendo os lábios.

“Eles não encontraram Sarah”, eu disse, com a boca cheia de bife.

“Aquela pobre criança”, meu pai murmurou, com as sobrancelhas se enrugando com compaixão. Ele deu uma mordida na comida e engoliu, antes de acrescentar, “você foi atormentada por aquelas crianças malvadas hoje, minha querida?”

Eu balancei a cabeça, mastigando.

“Bom. Eu acho que a cidade ficou meio quieta depois do desaparecimento.” Ele engoliu seu copo d’água em três pequenos goles, deixou seu prato e talheres de lado e saiu da sala.

Sugando um pedaço de carne do meio dos meus dentes, sem sucesso, eu usei meus dedinhos para removê-lo. Eu olhei para o que eu segurava na minha mãozinha. Um pedaço de fita e uma mecha de cabelo comprido e loiro. Eu sorri e continuei comendo.



quinta-feira, 26 de setembro de 2013

Rotina Noturna


Não olhe no espelho.

Você sabe como funciona. Eles olham no espelho e lá está, logo atrás deles. Só olhe pra baixo e ligue a torneira. Estique o braço e pegue a toalha. Não, o que quer que você tenha tocado, não está lá, recolha a mão, você não precisa secá-la mesmo, você está indo dormir. Mantenha a cabeça abaixada, mantenha o cabelo no rosto como um visor, olhe para os seus pés quando se virar. Agora abra a porta, não olhe pera o corredor, claro que ele estará logo ali, te encarando. Só continue olhando pra baixo, aja como se estivesse meio sonolento, talvez você possa enganá-lo. Vire à esquerda e siga em frente, não olhe para o corredor à esquerda ou direita quando chegar à porta, nem mesmo dê atenção à sua visão periférica. Só entre. Vá até o seu computador e desligue a tela. Você sabe exatamente onde fica o botão, não olhe para o que estiver piscando na tela, você sabe que o que quer que esteja ali não foi você que colocou. Só ajoelhe-se e pressione o botão de desligar, deve demorar somente uns cinco segundos mais ou menos. Vamos lá. Agora caminhe até o seu guarda roupa como antes. Não, não olhe para os pés dele, olhe para os seus, fique olhando para baixo e ande. Não caminhe muito rápido nem muito devagar. Tire sua camisa. Não demore muito, faça isso rápido, o mesmo para as suas calças. Cuidado, não tropece. Abra a gaveta e coloque sua roupa ali, ninguém se importa se é só de camisas, e não olhe pra mais nada que houver ali, só a feche. Uma parte da camisa ficou pra fora, abra a gaveta novamente, empurre a roupa pra dentro e feche-a. OK, agora vire-se de novo, olhando pra baixo. Não fique muito perto do pé da cama, não deixe-o agarrar seus tornozelos, só suba na cama. Agora pegue os travesseiros e deite-se de lado, com as costas para a parede, mantenha os olhos fechados, ignore a parede gelada. Agarre as cobertas com força por dentro, caso ele tente puxá-las. Mantenha os olhos fechados.

Não dê ouvidos a ele.

Vá dormir.



Original: //www.creepypasta.com/tag/micropasta/#eE8ChYyTWsz5kubW.99

terça-feira, 24 de setembro de 2013

Estranho à Mesa


Se você é do tipo que come fora regularmente, um dia um estranho poderá se sentar à sua mesa. Esse estranho irá aparentar ser do mesmo sexo e ter a mesma idade que você, e ele (ou ela) só irá aparecer se você estiver sozinho. Não importa que tipo de restaurante seja, ele sempre estará levando seu próprio prato de comida.

Após alguns segundos, ele irá olhar diretamente para você e dizer: "Você parece ser uma pessoa interessante. Posso te conhecer melhor?" Diga sim e ele começará a fazer perguntas sobre você, entre uma mordida e outra. Essas perguntas serão inofensivas a princípio: seu nome, com o que você trabalha, e por aí vai. Mas se você abrir a boca para responder, será forçado a dizer a verdade, mesmo se não souber conscientemente o que é essa verdade. Permaneça em silêncio e o estranho irá franzir as sobrancelhas, pegará seu prato e irá embora. Você nunca mais o verá. Entretanto, se você ceder às suas perguntas, elas ficarão mais obscuras conforme ele esvazia seu prato, e ficarão mais e mais difíceis de resistir. Não tente sair da mesa antes dele sob nenhuma circunstância.

Quando o prato dele estiver vazio, ele se levantará para ir embora, mas não sem fazer uma última e irresistível pergunta: "O que te levaria a tirar a própria vida?" Você irá perceber instantaneamente que será capaz de mentir em resposta a essa única pergunta, e eu sugiro que você faça isso. Porque o que quer que você descreva, irá acontecer no decorrer da semana. Os mais astutos conseguem usar essa resposta para ganhar o que quiserem, mas saiba que, se as circunstâncias que você descrever não te levarem ao suicídio, o estranho irá começar a tentar adivinhar o que poderia fazê-lo. E considere o quanto ele sabe sobre você.



domingo, 22 de setembro de 2013

O Portador da Guerra


Em qualquer cidade, em qualquer país, vá para qualquer instituição mental ou casa de repouso em que você puder entrar. Olhe para o teto com uma expressão de tédio enquanto caminha até a recepção e, com uma voz que parece estar a meio mundo de distância, peça para ver o “Portador da Guerra”. Você receberá um tapinha no ombro. Já será seguro olhar para o chão. O atendente irá sorrir educadamente e começará a andar, proferindo um discurso que parece quase mecânico, descrevendo a história da instituição. Não reaja ao seu discurso – ele é insanamente sangrento e cheio de descrições bastante visuais, mas reagir nesse ponto significa uma viagem só de ida para o inferno.

Depois de caminhar por um tempo, você irá chegar a uma porta minuciosamente trabalhada em mogno e ouro. Pare na frente dela. Mantenha sua expressão entediada, possivelmente adicionando um sorriso vazio, mas não reaja quando o atendente te agarrar pela gola da camisa, ou ele irá mudar o agarrão, te deixando sem cabeça.

O funcionário irá te empurrar pela porta e você a ouvirá batendo atrás de você. Você estará em um lugar que deve ter sido uma fazenda fértil há muito tempo atrás, mas agora não passa de um campo de batalha devastado e maldito.  Soldados vestindo duas cores – um branco horrivelmente brilhante e, de alguma forma, manchado, e um preto enjoante e imundo – batalham das formas mais horríveis possíveis, lutando com rifles, canhões, espadas, arcos e todas as armas de guerra que já existiram desde a aurora dos tempos.

Não retroceda diante desse campo de batalha, ou os soldados irão te notar, parar com seu combate e se virar contra você com um ódio voraz, pois você é a razão da luta deles. E em suas mentes febris, destruídas pela batalha, isso significa que você á a causa de todo aquele derramamento de sangue.

Também não tente voltar pela porta. Ela terá caído na lama, empurrada por um membro da infantaria, que estará gritando e empunhando um rifle com baioneta. Se você deixar que ele se sobreponha sobre voce, ele irá te rasgar em pedaços em apenas alguns segundos, mas de alguma forma não irá te matar. A dor da experiência irá indubitavelmente levar embora o que resta de sua sanidade.

Ao invés disso, deixe de lado sua expressão entediada e coloque um sorriso determinado no rosto. Caminhe direto para frente, de forma medida, com passos lineares ao estilo militar, até que você veja uma estrutura alta de três andares feita de concreto destruído, que deve um dia ter sido um bunker de comando. Não se vire enquanto fizer isso. Os blindados terão chegado ao campo de batalha, e se você parar ou diminuir o passo, os tanques irão te atropelar.

Uma vez que você tenha entrado no bunker, não dê atenção a ninguém que te fizer um pedido ou que tente falar com você, não importa o quão desesperados eles lhe pareçam. Cada um deles acha que você é o inimigo, e no momento em que você responder, será recompensado com uma faca no rosto. Ao invés disso, suba direto pelas escadas à sua frente, rumo ao segundo andar do bunker. Assim que você começar a subir as escadas, um estampido será ouvido atrás de você – é a porta de incêndio travando enquanto a tropa de lança chamas ataca.

No segundo nível, há apenas um homem, sentado em uma mesa, gritando ao telefone. As escadas para o terceiro andar são uma massa distorcida de concreto. O homem na mesa usa a insígnia de general, mas não parece perceber que o telefone, assim como todas as outras pessoas na sala, está morto.

Caminhe até ele, bata continência, e com sua melhor voz militar, grite “sim, senhor!” ele irá andar ao seu redor para te encarar. Se ele achar que você não é digno de seu exército, ele irá te desmembrar lentamente com suas próprias mãos, e você se unirá a ele em sua morte iminente. Se ele te achar digno, irá acenar com a cabeça e te encarar de forma severa. Ele não gosta de preguiçosos, então faça sua pergunta rapidamente.

A única coisa que ele irá responder é “Para onde devo ir, Senhor?”

Ele te dirá. Irá te contar com tantos detalhes, detalhes tão horripilantes, que você ficara tentado a estrangulá-lo. Nem tente – ele é um lutador muito mais experiente do que você jamais poderia sonhar em ser, e se você quebrar a continência, irá se deparar com uma morte bastante desagradável. Quando ele terminar, dirá “à vontade”, e te entregará sua pistola. Essa é a sua deixa para baixar a continência. Pegue a arma e coloque no seu coldre – se você não possuía nenhum antes, possui agora.

Uma explosão irá subitamente dizimar a parede mais distante e pulverizar o general. Através do buraco você verá, no horizonte, a forma alongada de um míssil em ascensão. 

Feche os olhos com força e não os abra por nada. Os sons da horrível batalha começarão a sumir até que, em meio ao silêncio, um tiro de escopeta soará. Abra os olhos.

Você estará no meio de um campo de trigo ondulante. De alguma forma, você saberá que este será o lugar onde a terrível batalha que você testemunhou irá acontecer. E você também sabe, de alguma forma, que você estará no lugar do general.

A pistola que lhe foi entregue é o 44º Objeto dos 538. Aprenda a usá-la – só há uma bala restante. Se você der o último tiro na hora certa, irá evitar o destino do general. Se não, se juntará a ele.



sábado, 21 de setembro de 2013

O Portador da Terra


Em qualquer cidade, em qualquer país, vá para qualquer instituição mental ou casa de repouso em que puder entrar. Quando chegar à recepção, peça para visitar alguém que se auto denomina "O Portador da Terra". O funcionário irá rir bem alto, atraindo a atenção de outra pessoa. O atendente permanecerá sentado, mas a pessoa cuja atenção ele despertou irá te chamar. Não pergunte nada enquanto ele te leva a um almoxarifado fora de uso, escondido no manicômio. Ele abrirá a porta para você e te pedirá que entre primeiro. Não faça isso, ou a escadaria além da porta irá desaparecer e você irá cair eternamente através da escuridão fria como o gelo. Ao invés disso, diga a ele "eu não me atreveria a contemplar essas visões antes de você". Se ele acreditar em você, ele irá acenar levemente e entrar, e então você poderá segui-lo. Se não, agradeça por você estar escondido o suficiente na instituição para ninguém te ouvir gritar.

Conforme você desce pelas escadas, irá ouvir gritos bestiais vindo de todos os lados, mas principalmente acima de você. Mantenha os olhos focados na escuridão abaixo de você (pois o homem terá desaparecido nas trevas, e mesmo assim você sentirá que não está sozinho). Você não deve olhar para cima, ou os demônios e crias do inferno, que te observam e zombam de você, irão descer e arrancar a carne de seus ossos, drenando seu sangue, rasgando seus músculos e tendões de uma forma absurdamente rápida.

Conforme desce, você sentirá a atmosfera ficar mais e mais sepulcral, e apesar de ser capaz de ouvir os demônios logo acima, sentirá como se finalmente houvesse um teto sobre você. Mas ainda deverá tomar o absoluto cuidado de não olhar para cima. Após uma quantia incalculável de tempo, seus pés tocarão um solo sólido e macio novamente. Se os demônios da escadaria tiverem parado de gritar, você não viverá para ver o chão. Se não pararem, você irá desejar que o tivessem feito, pois agora será a sua oportunidade de perguntar a única coisa que as trevas irão te responder. Você deve perguntar firmemente: "Como eles podem ser impedidos?"

Quando fizer essa pergunta, gemidos medonhos serão emitidos de baixo de você, apesar de você ainda sentir o chão sob seus pés. Você será capaz de sentir o cavalheiro que o guiou até ali se virar. Seus olhos irão te atravessar, apesar de você não conseguir vê-los. Você não deve jamais olhar para baixo ou desviar o olhar das trevas imediatamente à sua frente. Os gemidos irão continuar, ininteligíveis a princípio, mas uma voz masculina forte os guiará a um discurso em uníssono. Eles te dirão a única coisa que pode prevenir o resultado da união dos Objetos, misturada com cada conseqüência disso. Falarão sobre chuva incandescente caindo do céu, rios vermelhos com seu sangue, e muito mais.

Quando as conseqüências terminarem, as luzes irão se acender de repente. O homem que te levou até ali terá ido embora. Em seu lugar haverá um objeto que você não será capaz de enxergar nesse lugar sem que ele te leve à completa loucura. Você deve fechar os olhos assim que as luzes voltarem e tatear o chão às cegas, à procura da superfície morna e áspera do Objeto. Se você não fechar os olhos, verá do que o chão é realmente feito: cadáveres humanos desmembrados, todos sem os olhos, apesar de suas bocas ainda respirarem. Se você vislumbrar isso e não ficar louco imediatamente, se juntará a eles, se unindo à terra satânica.

Se obtiver sucesso em pegar o Objeto, você será transportado para o exterior da instituição, onde poderá abrir os olhos.

A pedra vulcânica é o 43º Objeto dos 538. Apesar de você saber como impedi-los de se reunir, não será capaz de fazer isso.




sexta-feira, 20 de setembro de 2013

O Portador da Estrela


Em qualquer cidade, em qualquer país, vá a qualquer instituição mental ou hospital e pergunte na recepção sobre alguém que se auto intitula "O Portador da Estrela". O funcionário irá te encarar nos olhos com um olhar presunçoso de desprezo por vários segundos. Se ele não vir a determinação de seu coração refletida em seus olhos, fuja, ou os guardas irão te prender  e te trancar em uma sala apertada onde você ouvirá a risada do homem desde o despertar até adormecer, enquanto você viver. Se ele enxergar a determinação em seus olhos, ele irá se levantar e te guiar por um corredor. Ele irá parar frente à porta de uma cela e te entregará a chave, e irá embora sem dizer nada. De chave na mão, segure a maçaneta e gire lentamente. Não estará trancada.

Ao invés de uma cela além da porta, haverá um corredor, timidamente iluminado. Entre e tranque a porta atrás de si. Conforme você anda por esse corredor, ouvirá o riso de crianças brincando, misturado ao cântico acalentador de monges estrangeiros. Rapidamente o riso irá se transformar em gritos e os cânticos em maldições. Enquanto você ouvir esses sons horríveis, estará seguro. Mas se sua coragem fraquejar, e o menor sinal de medo te dominar neste corredor, os sons irão parar. E se isso acontecer, feche os olhos e reze para que qualquer que seja a criatura que acaba de despertar arranque sua vida na primeira mordida. Se você sobreviver a esse corredor, chegará a uma pequena porta trancada. As luzes irão diminuir ao seu redor até que tudo o que você possa ver seja a porta. Quando tudo estiver escuro, use a chave que lhe foi entregue e destranque a porta. Entre por ela em uma pequena e escura cela. Ali há um velho vestindo um robe e capuz vermelhos. Ele segura uma vela e mantém seus olhos fechados enquanto recita cânticos. Ele estará sentado no meio de um pentagrama do qual emana um brilho avermelhado. O fedor que exala dele te fará engasgar, mas não se atreva a fazer nada mais do que isso. Diante do homem haverá uma rocha incandescente. Não olhe diretamente para a rocha por muito tempo, ou seu calor irá envolver sua mente e mandar seu corpo para uma eternidade ardente. Ao invés disso, encare a vela e escute ao velho senhor.

Ele responderá a apenas uma pergunta: "O que deve ser feito para completar a tarefa deles?" O homem irá parar de recitar e irá te dizer cinco nomes e fazer cinco perguntas. Ele te dirá que cabe a você aprender por conta própria qual se relaciona com qual. Ele então irá tocar o sangue no pentagrama com seu dedo indicador e desenhará uma fórmula na parede. Uma chave, mais um livro, mais uma pena, mais uma palavra rabiscada de forma ilegível, são iguais a um livro aberto com três formas ovais desenhadas ao seu redor. Ele irá rir calorosamente e retornar à posição em eu estava sentado. Ele te entregará a pedra ainda incandescente e de trás de seu robe ele irá tirar um coração ainda batendo. Com toda a sua força, esmague órgão até que ele não se mova mais. Dentro do emaranhado de carne você encontrará uma caneta tinteiro antiga. Quando você olhar para cima de volta, verá o velho morto, com um olhar sereno de contentamento em seu rosto. Preste a última homenagem a esse homem, fechando para sempre seus olhos vidrados, e saia da sala. As trevas irão te envolver, e quando forem embora você se verá do lado de fora do hospital.

Você irá descobrir que a caneta nunca precisará de recarga para sua tinta vermelha. Apesar de não possuir o cheiro, você perceberá que é o seu sangue que escorre da caneta para o papel. Se você permitir que esse objeto seja destruído, uma morte horrivelmente lenta se abaterá sobre você. Enquanto mantiver a posse desse item, você ouvirá cânticos, sussurrados no fundo de sua mente, até que você morra ou até que faça o que eles pedem.

Essa caneta é o 42º Objeto dos 538. Ela deseja que você escreva no tomo amaldiçoado com seu próprio sangue. Fazer isso é tolice. É de sua escolha continuar o trabalho deles ou destruir a única chance de todos os Objetos se reunirem novamente.







De volta com os Portadores! E só pra deixar registrado: Aparentemente o site theholders.org está botando a casa em ordem e está tudo voltando ao normal. Parece que resolveram substituir as nojeiras mal escritas por contos bem melhores, como esse, por exemplo, que na minha humilde opinião é um dos melhores da série. Finalmente um conto onde não depende simplesmente da sorte sair vivo do sanatório com o objeto na mão. Dá até vontade de entrar no primeiro hospital e perguntar pelo tal Portador da Estrela. Por que não? :D

quinta-feira, 19 de setembro de 2013

O Armário


Ummm… olá. Eu acho que pode-se dizer que estou escrevendo isso como um conselho na forma de conto, pra quem futuramente planeja estudar no exterior. Primeiramente, eu não pretendo te desencorajar, eu apenas quero te deixar avisado, pra que algo assim não aconteça com você também.

Acho que eu deveria me explicar melhor. No verão passado eu fui selecionada para participar de um programa de intercâmbio, que seria realizado em Roma e duraria alguns meses. Como qualquer pessoa, eu fiquei eufórica. Nunca estive fora do país antes, então isso seria uma grande aventura pra mim.

Nas semanas seguintes, eu alegremente amontoei tudo e qualquer coisa que coubesse dentro da minha mala (tenho que admitir que eu tinha muito mais bagagem do que o necessário para essa viagem). Eu estava nervosa quanto a deixar os meus pais pela primeira vez, mas também estava empolgada pela recém descoberta liberdade que eu teria na Europa. Antes que eu me desse conta, meus pais já tinham me deixado no aeroporto e eu estava embarcando em um vôo de 19 horas para Roma.

Apesar de ser longo e tedioso, o vôo não foi tão mal. Quando saí do aeroporto, fui recepcionado pelo supervisor do programa e vários outros alunos que estudariam comigo. Eles tinham mais ou menos a mesma idade e pareciam tão ansiosos quanto eu. Dali nós fomos para a reunião obrigatória de orientação, e em seguida fomos pegar as chaves dos nossos apartamentos.

Nos meses que antecederam a viagem, nós fomos responsáveis por conhecer nossos colegas de quarto, bem como encontrar um lugar pra ficar que todos pudessem pagar. Eu iria ficar com três garotas. Todas elas eram bem legais e se esforçaram pra me fazer sentir bem-vinda, apesar de eu achar bem difícil se aproximar de um grupo já formado de amigas. Mas apesar da minha ligeira alienação, parecia que as coisas iriam correr bem. Todas tínhamos mais ou menos as mesmas condições financeiras, e com isso eu quero dizer que nenhuma de nós tinha muito dinheiro pra gastar. Por causa disso, todas estávamos no mesmo barco, pesquisando o apartamento mais barato que podíamos encontrar.

Depois de vários dias de pesquisa, cruzamos com um apartamento antigo, localizado sobre o Campo di Fiori. Era um local nobre e nós não conseguíamos acreditar que ainda estava disponível, muito menos por um preço incrivelmente baixo. Isso imediatamente me deixou apreensiva. O lugar era enorme, e mesmo assim o aluguel era mais barato do que o de apartamentos muito menores em partes muito menos desejadas da cidade. Entretanto, razão nunca funciona muito bem contra um grupo de garotas empolgadas. Elas já tinham tomado sua decisão e se eu quisesse ficar com elas, essa era minha única opção.

Cada uma de nós recebeu seu suas próprias chaves, assim como um mapa. Devido à sua localização privilegiada, não demorou muito pra chegarmos lá. O Campo era magnífico. Durante o dia, vibrava com um mercado lotado, e durante a noite ficava cheio de artistas de rua. Todos os apartamentos ao redor pareciam ser antigos, então o nosso não se destacava tanto. Depois de circular a praça uma três ou quatro vezes, nós finalmente notamos um número pregado em uma porta maciça de madeira. Essa seria nossa casa pelos próximos três meses. 

Eu briguei com as chaves por um momento, até que houve um estalo na velha e pesada fechadura. A porta grossa se abriu com um rangido. Então nós vimos uma grande escada em espiral. Nós olhamos umas para as outras e demos um suspiro. Nenhuma de nós tinha se ligado que o prédio havia sido construído antes dos elevadores se tornarem comuns. Então, três lances de escada e muitas reclamações depois, nós quatro, com a bagagem na mão, paramos do lado de fora da nossa porta. Novamente eu peguei meu molho de chaves e briguei com a fechadura teimosa. Assim que a porta se abriu, houve um estouro de garotas tentando pegar os melhores quartos. Era um apartamento de três quartos, então duas de nós teriam que dividir. Particularmente, eu não me importava, então as deixei batalhando sozinhas. Quando a poeira baixou, descobri que eu dividiria um quarto com uma garoa chamada Stephanie. Pra mim estava ótimo. Stephanie era legal e também bastante quieta, minha característica preferida em um colega de quarto.

No decorrer do dia, nos exploramos nossa nova casa. Havia dois banheiros, uma cozinha completa e uma sala de estar com uma TV antiga. Mais uma vez eu comecei e me sentir desconfortável. Como é que nós tínhamos conseguido tudo isso por um preço tão pequeno? Mas antes que eu pudesse concluir a linha de raciocínio, fui interrompido por uma seqüência de gritos estridentes. Minha primeira reação foi entrar em pânico, mas logo percebi que eram gritos de empolgação. Na outra extremidade do apartamento, perto da porta de entrada, aparentemente havia uma outra parte do flat que não havíamos notado. Eu segui o barulho até um corredor longo e escuro. Ao final dele, atrás do grupo de mulheres gritando, havia uma máquina de lavar e secadora. E para aqueles pensando "e o que isso tem de mais?", eu devo explicar que essas coisas são extremamente raras em Roma. Geralmente, estudantes de intercâmbio tem que lavar as próprias roupas na mão antes de pendurá-las pra secar. O que um item de luxo como esse estava fazendo em um apartamento tão barato?

Assim que os gritos pararam, eu em recompus e as garotas notaram uma porta adjacente à máquina de lavar. Atrás daquela porta havia um banheiro máster. Tinha uma sacada, uma banheira e até um bidê. As garotas imediatamente começaram a brigar para ver "de quem aquele banheiro seria". Eu realmente não via porque não podíamos dividir, mas pelo jeito cada uma delas queria ser a dona. No final das contas ele virou o meu banheiro. Stephanie usou o argumento de que, como ela e eu dividíamos um quarto e as outras tinham o seu próprio, seria justo que nós ficássemos com o banheiro máster.  E tenho que admitir que a princípio eu estava meio que empolgada porque, no final das contas, era realmente um cômodo muito legal. No entanto, com o decorrer das semanas, eu comecei a ficar mais e mais desconfiada daquele banheiro. Eu não sei exatamente como traduzir em palavras. É como se, cada vez que eu entrasse naquele cômodo, podia sentir os olhos de algo me observando. E o fato de me sentir observada não era o que realmente me deixava nervosa. Era como se o que quer que estivesse me observando estivesse com raiva, como se não me quisesse ali, como se quisesse me ferir.

Eu comecei a fazer tudo que estava ao meu alcance para evitar o banheiro. De vez em quando eu pedia à Alyssa para usar o banheiro dela. Eu usava a desculpa de que isso era bem mais conveniente, pois o banheiro dela ficava perto do meu quarto, enquanto o outro ficava na outra ponta do longo corredor. Ela concordou alegremente quando eu disse que ela poderia usar o meu banheiro quando quisesse. Isso funcionou bem por um tempo. Pelos primeiros dois meses de viagem, eu fui capaz de evitar o banheiro sinistro. Foi só no último mês que tudo começou a ficar claro. Certa noite, enquanto eu me preparava pra escovar os dentes, vi que Alyssa já estava ocupando o banheiro. Eu ouvia risadinhas vindo do corredor, o que significava que tanto Stephanie quanto nossa outra colega de quarto já estavam no banheiro máster, se preparando para ir para a cama. Já que a união faz a força, eu decidi que não teria problema em usá-lo só hoje.

Então andei pelo corredor para me juntar às garotas e escovar os dentes. Elas estavam no meio de uma conversa quando Linsay, nossa outra colega de quarto, irrompeu em um ataque de riso tão violento que ela teve que se apoiar na parede pra não cair. Mas de repente ela deu um salto, como se tivesse levado um choque. Nós olhamos para o que deveria ter sido a causa de sua reação: na parede, mais ou menos na mesma altura da banheira, havia uma pequena porta. Nenhuma de nós havia notado porque ela era da mesma cor das paredes. O senhorio tinha até pintado por cima dela. Naturalmente, isso me deixou meio tensa. O que quer que fosse, o senhorio claramente não queria que ninguém abrisse. Mas, como de costume, jogando toda a cautela no lixo, Lindsay segurou a maçaneta e começou a puxar com toda a força. Stephanie estalou a língua em desaprovação entes de sacar um pequeno canivete. Ela começou a entalhar delicadamente todo o contorno da porta. Eu queria pedir para que ela parasse, mas eu realmente não tinha energia para discutir naquela noite. Então, em alguns minutos, Lindsay havia arreganhado a pequena porta com um estalo.

Era... um armário. Era bem grande. Meu palpite era de que cabiam pelo menos umas três ou quatro pessoas ali. Eu estava curiosa do porque o senhorio ter selado uma salinha vazia. Enquanto eu refletia sobre isso, Stephanie e Lindsay começara a chamar por Alisha para ver nosso novo achado. Ela estava tão empolgada quanto as outras no momento da descoberta. Entretanto, como era de se esperar, essa empolgação diminuiu com o tempo, e eventualmente o armarinho se transformou em depósito de toalhas e cestos de roupa.

Nos dias seguintes à abertura do armário, as coisas começaram a mudar de estranhas para completamente aterrorizantes. De uma forma bem irritante, Alisha tinha mudado sua rotina noturna pra que eu não usasse mais o banheiro dela à noite. Mais uma vez eu estava de volta no banheiro grande, o tempo todo com um sentimento cada vez pior de que eu estava sendo observada. Eu comecei a ficar tão paranóica quando entrava nesse banheiro, que eu literalmente pulava ao menor ruído do encanamento, e assim que eu terminava, corria o mais rápido que podia, atravessava o corredor e fechava a porta atrás de mim. Por alguma razão, parecia que eu era a única se sentindo assim. E eu também não podia contar para as garotas. Eu já estava deslocada o suficiente do jeito que estava. Então não contei pra ninguém e esperei que fosse embora logo.

Infelizmente não foi o caso. Em uma noite, enquanto eu me preparava pra ir pra cama, me vi sozinha no banheiro. Conforme eu parei na frente do espelho, escovando os dentes, algo fez os cabelos da minha nuca arrepiarem. Ouvi um pequeno farfalhar. Não do tipo que poderia ter sido causado pelas minhas colegas de quarto do outro lado do corredor. Qualquer barulho causado por elas teria que ser bem alto pra me alcançar no final do corredor. Não, esse ruído era bem fraco, o som de alguém cuidadosamente revirando coisas por aí. Eu fiquei em completo silêncio, com o terror me dominando. O suave farfalhar estava vindo de dentro do armário. Eu girei nos calcanhares e corri pelo corredor para chamar a atenção das minhas colegas de quarto. Eu tentei explicar o que tinha acontecido, mas só conseguia pronunciar murmúrios incoerentes.

Logo eu consegui gaguejar "A-Aguma coisa. Alguma coisa está dentro do armário."

Elas olharam pra mim com medo e confusão em seus olhos. Juntas, nós percorremos o corredor e entramos no banheiro. Eu quase desmaiei quando vi a pequena porta totalmente aberta. Apesar dessa descoberta me encher de terror, Alisha imediatamente apontou para a porta de correr da sacada. Quando saiu do banho, algumas horas atrás, Stephanie a deixou aberta para arejar o banheiro. Ela olhou pra fora e apontou para o telhado inclinado ao lado do nosso. Ali tinha um ninho de pombos ocupado por alguns pássaros. As garotas presumiram que um pombo deve ter entrado e havia sido o motivo da confusão. Todas elas riram bastante enquanto voltávamos para a sala de estar. Eu fingi esquecer isso, mas sabia que não tinha sido um pombo que causou o ruído de farfalhar. Primeiro, a porta ficou fechada o dia inteiro. Nenhuma de nós quis deixar aberta porque cheirava a mofo lá dentro. E segundo, a porta estava fechada quando eu saí do banheiro, tenho certeza, e mesmo assim estava escancarada quando voltei. Não venha me dizer que um pombo tem conhecimento e habilidade suficientes pra ser capaz de abrir e fechar uma porta por conta própria.

Foi a partir daí que eu comecei a suspeitar que havia algo terrivelmente errado com esse apartamento. Quando voltei pro meu quarto, peguei o meu notebook e liguei pra minha melhor amiga via Skype. Ela sempre foi metódica e cética, apesar de manter a mente aberta diante de coisas difíceis de explicar. Eu decidi que ela era a melhor pessoa com quem conversar sobre a minha situação. Como eu esperava, ela estava bastante descrente a princípio. Embora concordasse comigo que um pombo não poderia ter sido a fonte. Ela me perguntou se eu tinha alguma foto do sótão. Ela disse que se pudesse ver isso poderia fazê-la entender melhor, e possivelmente ajudá-la a elaborar uma explicação mais lógica.

Aliviada pela boa vontade dela em pelo menos me ouvir, eu peguei minha câmera e voltei pelo corredor sinistro. Quando cheguei, para o meu alívio, vi que a porta ainda estava fechada. Eu parei na frente dela por um momento, juntando coragem antes de finalmente abrir a porta. Apesar da desordem deixada pelas minhas colegas, estava vazio. Eu tirei uma foto rápida antes de fechar a porta mais uma vez e correr de volta para o meu quarto. Eu liguei imediatamente a câmera no computador e fiz o upload da foto. Quando finalmente abri a imagem, fiquei petrificada pelo que vi. No canto superior direito havia um rosto, mostrando os dentes pra mim. Meu corpo inteiro começou a tremer violentamente.

"Santo Deus. Aquela coisa está na nossa casa!" eu murmurei pra mim mesma.

O medo começou a me dominar. Alguém trancou o que quer que seja dentro daquele sótão, e nós o deixamos sair. Eu estava tão absorta em meu pânico que nem notei que minha colega de quarto voltou. Ela estava tão alegremente alheia ao perigo iminente, e mesmo que eu tentasse alertá-la ela não acreditaria em mim. Eu não tinha idéia do que deveria fazer, e finalmente decidi que iria lidar com isso de manhã. Não que fosse grande coisa, mas eu me sentia mais corajosa à luz do sol. Então eu tentei dormir um pouco. Pela primeira vez desde que fomos para esse lugar, eu tranquei a porta do quarto antes de ir para a cama. Stephanie me olhou com suspeita enquanto eu fazia isso, mas eu lhe disse brincando que Lindsay havia entrado no nosso quarto algumas noites antes e tinha roubado minha Nutella. Ela riu com vontade, balançando a cabeça antes de se arrumar pra dormir. Eu admito que o único motivo pelo qual eu consegui dormir foi a presença dela. Algo sobre não estar sozinho dá uma sensação de falsa segurança pras pessoasa.

Era cerca de duas da manhã quando o barulho me acordou. Eu sempre tive sono leve, então o ruído fraco foi suficiente pra me despertar. Parecia uma porta sendo escancarada do outro lado do apartamento, seguido de passos. Mas não eram passos normais. Eram bem mais rápidos. Era como se alguém estivesse correndo a toda velocidade desde o vestíbulo até a sala de estar, e pelo apartamento inteiro. Mas não eram passos pesados, do tipo que você esperaria de uma pessoa correndo. Eram bem suaves, quase sobrenaturais. Minha reação inicial foi presumir que era a Alisha ou a Lindsay, então eu levantei e coloquei o ouvido na parede atrás de mim, que separava o quarto da Lindsay do meu. Eu podia ouvir sua respiração, fraca mas constante. Ela estava claramente dormindo, não era ela. Então eu atravessei o quarto e coloquei o ouvido na parede de novo. O ronco da Alisha era bem audível, sem chance de ser ela. Eu lentamente fui ficando assustada enquanto me virava para verificar a última opção, se Stephanie tinha se levantado. Mas eu podia ver claramente sua silhueta se movendo lentamente pra cima e para baixo. Um arrepio percorreu minha espinha e eu quase gritei quando percebi que os passos pararam do lado de fora da minha porta. Mesmo com todas as luzes apagadas, eu podia ver nitidamente a sombra ameaçadora que penetrava pela fresta debaixo da porta.

Eu nem me atrevi a me mexer. O que quer que fosse, estava parado ali. Esperando. Para o meu horror, a maçaneta lentamente começou a se mexer. Gentilmente a princípio, mas depois mais violentamente, percebendo que estava trancada. O barulho eventualmente acordou minha colega de quarto. Ela se sentou, piscando em meio à confusão. Naquele instante o barulho da maçaneta parou. Ela me perguntou o que raios eu estava fazendo e se eu sabia que horas eram. Eu disse a ela que não havia sido eu! Eu disse que o que quer que tivesse aberto a porta do banheiro para o sótão no dia anterior tinha voltado. Mas ela só franziu a sobrancelha pra mim e disse que eu precisava dormir mais um pouco.

No dia seguinte eu marquei um horário com o supervisor do programa. Eu disse a ele que eu precisava voltar pra casa. Ele tentou me dizer que eu só estava com saudade de casa e que isso iria passar, mas eu insisti. Ele então cedeu e me deixou ligar para os meus pais. Eles ficaram confusos, mas compreenderam. Eles conseguiram mudar a data do meu vôo de volta para a manhã seguinte. Eu realmente queria ir embora dali naquele dia, mas compreendi que isso foi o mais cedo que eles conseguiram arrumar. Infelizmente isso significava que eu teria que passar mais uma noite no apartamento.

Quando voltei eu tentei explicar às outras o que tinha acontecido.  Eu já estava indo embora dali e que estaria fora de perigo, mas ainda estava imensamente preocupada com a segurança delas. Mas ninguém me levou a sério, só olharam pra mim como se eu fosse louca. Elas não disseram nada, mas eu tinha certeza que elas achavam que eu estava indo pra casa por causa de algum surto nervoso ou algo assim.

Naquele ponto não havia nada que eu dissesse que pudesse convencê-las. Então naquela noite eu tranquei minha porta e, hesitante, fui pra cama. E bem na hora, mais uma vez perto das duas da manhã, fui acordada pelos passos rápidos correndo pelo apartamento. Eu podia ouvir a porta do banheiro abrindo com um rangido, seguida pela porta no fim do corredor. Os passos ficaram mais altos e mais rápidos conforme se moviam pelo apartamento. E finalmente, mais uma vez, eles pararam diante da minha porta. Eu podia ouvir uma respiração dessa vez, lenta e pesada. Eu me sentei, em pânico, e para o meu horror vi que Stephanie tinha se esquecido de trancar a porta atrás de si depois de levantar para usar o banheiro.

Ele estava bem na frente da minha porta e eu não sabia se teria tempo suficiente para saltar e tentar trancá-la, antes que a coisa percebesse que não havia nada bloqueando seu caminho. Eu hesitei por um momento longo demais, e na hora em que eu me endireitei na cama, a maçaneta começou lentamente a virar. Eu fiquei paralisada de terror conforme a porta abriu, revelando meu algoz. Ele ficou parado ameaçadoramente na soleira da porta, me encarando. Seus olhos saltavam um pouco das órbitas e tinham um brilho azulado bem fraco. Não parecia ter um nariz, somente fendas onde as narinas deveriam estar. Possuía os dentes de um homem, mas sem lábios, dando a impressão de um eterno sorriso. Sua pele branco-acinzentada estava esticada sobre sua face ossuda. O resto de sua forma esquelética era difícil de discernir, pois ele estava quase totalmente envolvido em trevas.

Após uma pausa momentânea no batente da porta, ele começou a vir na minha direção. Conforme ele se movia, seu corpo soltava rangidos. Eu me sentei ali, ainda petrificada de medo, até que ele chegou perto do pé da cama. Sua respiração pesada era ensurdecedora. Eu não sei como Stephanie conseguia dormir. O ar começou a ficar azedo e estagnado.

Com uma velocidade assustadora, ele saltou para o outro lado da cama, ficando a menos de meio metro de distância de mim. Eu engasguei com seu cheiro, semelhante a enxofre e carne podre. Lentamente, ele expôs uma das garras de sua mão deformada e a movimentou na minha direção. Quando ela estava a poucos centímetros de distância, finalmente recuperei minha voz. Eu gritei o mais alto que pude e ele se contraiu. Stephanie saltou da cama, visivelmente assustada. A criatura arqueou as costas e se apoiou nos quatro membros, fugindo com movimentos arrepiantes, que lembravam os de uma aranha. Um momento depois, Stephanie acendeu a luz e olhou pra mim, furiosa. Ela exigiu saber o que era toda aquela confusão. Eu contei a ela exatamente o que aconteceu, mas ela simplesmente me chamou de maluca.

O taxi chegou pra me buscar bem cedo na manhã seguinte. O sol nem tinha nascido ainda. Nenhuma das garotas veio se despedir, mas eu já esperava por isso. Depois de carregar minha bagagem no porta malas, eu sentei no banco de trás de velho táxi. Ele tinha passado pela praça e estava bem abaixo do meu apartamento. Quando eu me inclinei para olhar pela janela, eu podia ver onde era o meu quarto. Meu rosto se contorceu em uma mistura de pânico e preocupação. Ali, olhando pela minha velha janela, estava a criatura. Seus olhos, que não piscavam, fixados em mim e sua boca sem lábios curvada em um sorriso macabro. Antes que eu pudesse dizer alguma coisa, o táxi partiu, deixando a casa para trás.

Eu tentei avisá-las. Eu realmente tentei. Eu fiz tudo que estava ao meu alcance para avisá-las do perigo no qual estavam, mas nenhuma delas me deu ouvidos. Não havia maneira de eu ter impedido o que aconteceu depois de eu ter voltado pra casa. Veja, algumas semanas depois de eu ter retornado para os Estados Unidos, recebi um telefonema do diretor do programa. Ele me informou que um dia antes do programa terminar, as minhas três ex-companheiras de quarto haviam desaparecido. As autoridades não faziam idéia de há quanto tempo elas tinham realmente sumido, pois apenas recentemente deram por falta delas. O diretor do programa tinha ido verificar se estava tudo bem com elas, após elas terem faltado na reunião do programa. Eles presumiram que isso já faz pelo menos uma ou duas semanas, já que toda a comida no apartamento estava estragada. Não havia sinal de arrombamento e nenhum objeto de valor havia sido roubado.

O único detalhe relevante mencionado no relatório era que quando eles chegaram no local, havia uma portinha esquisita escancarada no banheiro. E quando eles se aproximaram, sentiram um odor muito forte vindo de alguma fonte não identificada. O relatório oficial as declarou como desaparecidas, mas eu sei que elas estão todas mortas. 

Eu sei que sou incrivelmente sortuda de ter escapado com vida. Eu acho que a única razão de eu ainda estar viva é porque voei por milhares de quilômetros e atravessei um oceano. Apesar da falta de vontade delas em me ouvir, eu ainda sinto uma quantia inimaginável de culpa sobre o que aconteceu com aquelas garotas. É por isso que estou escrevendo essas coisas. Eu posso não ser capaz de voltar no tempo e salvá-las, mas talvez eu possa prevenir que isso aconteça com você. Por favor, POR FAVOR, preste atenção ao meu aviso. Se você algum dia tiver a oportunidade de fazer intercâmbio de estudos, mantenha isso em mente: se parecer bom demais pra ser verdade, provavelmente é mesmo. E O QUE QUER QUE VOCÊ FAÇA, não se hospede no terceiro andar do velho condomínio amarelo sobre o Campo di Fiori. Há algo naquele lugar. Algo maligno.




quarta-feira, 18 de setembro de 2013

O Túnel




Olá gente. Antes de tudo, peço desculpas pelas duas semanas sem postar nada. Me comprometi a postar pelo menos uma conto por dia, mas fiquei esse tempo todo sem colocar nada de novo. Foi mal. Então, sem desculpas esfarrapadas, volto agora a publicar. Espero que gostem, e não esqueçam de comentar e fazer sugestões.


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Eu sou aluno de uma faculdade perto da zona rural, no oeste de Minas Gerais. E como qualquer faculdade meio isolada nesse país, ela possui seu estoque de rumores sobre fantasmas. Tem o fantasma da Nina, que assombra o auditório, o fantasma sem nome que assombra os dormitórios do antigo Túnel Escuro, as centenas de cadáveres no fundo da lagoa, etc. Mas eles são tão divulgados (até mesmo pela administração) que são difíceis de acreditar. Mesmo assim, de vez em quando você pode ouvir a respeito do fantasma que perambula por um túnel no nosso campus. Ele segue desde o auditório até uns prédios velhos de dormitórios, que são comumente usados como salão de festas.

Mas esse boato é raramente ouvido. A maioria dos alunos nem deve saber que aquela porcaria de túnel existe. Mas alguns amigos meus e eu ouvimos sobre ele de uma pessoa que morou no prédio antigo que fica na extremidade do túnel. Ele descobriu enquanto explorava o lugar. Tinha se assustado por causa de algum barulho e "vazou dali e não voltou mais". Alguns dias depois dele ter nos contado isso, eu fui até um dos caras mais velhos da manutenção, que já estava no campus fazia um bom tempo, e ele confirmou a existência do túnel. E acrescentou: "Eu não iria até lá. Pelo menos não sem acender as luzes."

Então, certa noite, meus amigos e eu ficamos meio bêbados e decidimos descer pelo túnel... Com as luzes apagadas. Só pra garantir que ninguém se machucasse, tiramos no palitinho, e quem tirasse o palitinho menor iria percorrer o corredor, enquanto o resto esperava. Nós pegamos uma câmera com visão noturna com o pessoal da tecnologia, e emprestamos alguns walkie-talkies dos amigos dos meus pais, que moravam a meia hora da faculdade. Havia cinco de nós, então dois iriam esperar em cada extremidade do túnel (entrando pelo respectivo prédio) e alguém iria fazer a travessia com a câmera. Se algo desse errado, usaríamos os walkie-talkies.

Como sou gordo e preguiçoso, me certifiquei de pegar um palitinho longo, então meu amigo Caio acabou sendo escolhido. Quando descemos para o túnel, estava escuro pra caralho e cheirava a mijo de gato.  Não faço idéia do por que. Caio começou pela extremidade onde eu estava, onde ficava o interruptor (na verdade nem era um interruptor, era uma puta alavanca em uma caixa de fusíveis, você já deve ter visto um desses). Nós testamos os walkie-talkies e depois ficamos em silêncio. Caio contou até três e partiu.

Nós viramos as lanternas na direção oposta do túnel, pra ver se tinha alguém vindo e pra garantir a eficiência da visão noturna da câmera. Ouvimos os passos do Caio por um minuto, antes deles sumirem por completo. Então esperamos pela ligação dizendo que ele havia chegado do outro lado. Esperamos pelo que pareceu uma porra de uma eternidade. Então, de repente, uma voz saiu do walkie-talkie. Era a outra "equipe".
"Ei, o Caio já começou? A gente tá entediado pra cacete aqui."
Eu olhei no relógio. Caio tinha saído fazia quase uma hora.
"Véio, ele saiu faz uma hora, eu pensei que vocês estivessem zoando com a gente."
"Mas que merda você tá falando? Liga o interruptor, assim que a gente vir a luz, nos encontramos no meio do corredor".
Levou um minuto pra alavanca cooperar. Seja lá pra que servia esse túnel, obviamente não o usavam há algum tempo, e a alavanca estava bem enferrujada. Quando consegui mover aquela porcaria, levou um momento para as luzes se acenderem pelo corredor. Alguns segundos depois, ouvimos o walkie-talkie de novo.
"Certo, comecem a correr."
O túnel não deveria ter mais do que 350 ou 400 metros, e o no caminho todo não tinha nenhuma escada, grade de esgoto, porta ou qualquer saída do túnel que não fosse a saída pelo prédio na outra ponta. Após alguns momentos de corrida, eu podia ouvir a outra equipe chegando até nós. Quando eu estava prestes a chamá-los, eu tropecei.

Eu estava meio zonzo por atingir o concreto, mas só lavou alguns segundos para perceber no que eu havia tropeçado. Era a porra daquela câmera. Pelo menos o que havia restado dela. Não tinha lentes e o cabo estava destruído, o visor estava rachado, e a tela giratória estava pendurada pelos fios.
"Cadê o Caio? Cadê a merda do walkie-talkie dele?"
Isso foi tudo que ficamos nos perguntando, até que eu finalmente me levantei, enfiei os restos da câmera na minha mochila e disse "Foda-se, temos que sair daqui, vamos ligar pra ele quando estivermos lá fora e descobriremos onde ele está." (Como o túnel ficava no outro lado do campus, oposto aos prédios novos, nós dirigimos até lá e deixamos nossos celulares no carro).

Sessenta. E sete. Ligações.

Nós ligamos pra ele 67 vezes nessa porra e não conseguimos encontrá-lo. Isso foi há uma semana. Ligamos mais ainda desde aquele dia. Deus sabe quantas vezes. O colega de quarto dele não pára de me mandar mensagens. Deus, estou com tanto medo de onde ele está. E ficou ainda mais estranho, porque o cartão de memória não estava na câmera quando eu a examinei no meu dormitório. Hoje recebi um e-mail dizendo que tinha um pacote pra mim na sala de correspondências. Quando eu abri, tudo que havia ali era o celular do Caio, o cartão de memória e um bilhete que dizia "eu não assistiria isso". O celular dele parou de contar no 99, mas tinha ligações da mãe e da namorada e inúmeras mensagens de texto. Eu não conseguia ver tudo isso. Ele tinha que estar em algum lugar lá fora. Eu sei que não deveria assistir o que está no cartão de memória, mas preciso saber onde ele está.

Estou tão assustado agora. Terminei de assistir o que tinha na porra do cartão. Estou assustado pra caralho. Assim que terminou, a luz do meu quarto apagou. Já está piscando há alguns dias, então é provavelmente só uma coincidência. O que é preocupante é que no final da gravação eu podia jurar que vi o rosto do zelador no antepenúltimo quadro (frame). Eu pausei umas vinte vezes e tinha que ser ele. Tinha que ser. Mais preocupante ainda é esse barulho vindo do teto. Como se alguém estivesse pisando ali. Quando eu Morava no terceiro andar, isso era comum. Mas estou no quarto andar agora. Não tem nada entre mim e o teto, exceto talvez um espaço de um metro com alguns sistemas de ventilação, fios e afins. As batidas não param. Faça essa porra parar!

O celular do Caio me mandou uma mensagem um minuto atrás. Eu o deixei na sala de estar, então pensei que foi o meu colega de quarto. Mas ele foi passar o fim de semana em casa. Não voltará até amanhã. A porta está fechada e tranca automaticamente. Eu fui até a sala de estar e a porcaria do telefone não estava lá. Eu liguei pra ele três vezes. Na Terceira, atenderam. Eu ouvi uma respiração, então desligaram. Eu mandei mensagens pro resto do pessoal, mas ninguém respondeu. Oh Deus, o que eu vou fazer?

Eu tentei sair pra fumar um cigarro e me acalmar, mas a porta não abria. Não importa quanta força eu coloque na maçaneta, ela não gira. Estou certo de que estou ficando louco. O celular do Caio está me ligando.
Eu queria nunca ter começado a contar essa história pra vocês. Eu queria não ter recebido o e-mail sobre o pacote.
Eu queria nunca ter ficado curioso e ter visto o cartão de memória no meu computador.
E acima de tudo, queria que houvesse mais do que uma respiração saindo do meu telefone.

Puta merda. A tela do celular não está funcionando. Eu peguei o telefone e desliguei imediatamente, e não tinha percebido isso até agora.

A respiração está na minha orelha.

Posso ver o reflexo dele na tela do computador. Ele sabe que isso é a última coisa que eu vou escrever, então está me deixando terminar. Nunca desçam por aquela merda de túnel. Nunca ignorem o conselho de um velho.

Adeus creepy traduções. Você foi bem útil.






Nota: Alguns detalhes do conto foram modificados.

quarta-feira, 4 de setembro de 2013

Morte no Sonho


Você já morreu em um sonho e então acordou?

Isso significa que uma versão alternativa de você, em uma linha do tempo diferente da sua, morreu. Sonhos sobre você mesmo são um vislumbre do que está acontecendo com outras versões de você.

Isso também explicaria porque algumas vezes uma pessoa sonha com algo que acontece logo depois. Você simplesmente tem que escolher suas ações no sonho, e então se torna a versão de você daquele sonho. A sua linha do tempo se torna a dele e vice-versa.


Contudo, tente ser cuidadoso. Também não se esqueça do que acontece com as versões de você que morreram, ok? Lembre-se: você acordado também é o sonho de outra versão de você dormindo.


Porque Eu Não Vou Mais Acampar


Eu já freqüentava o Acampamento Rock Water havia quatro anos. Eu amava acampar, poder conhecer rostos novos, me divertir e praticar atividades diferentes. Minha parte favorita era a tirolesa no rio. Uma vez na corda, eu não queria sair de lá. Eu estava tão empolgado em voltar, principalmente porque seria o meu último ano lá. O verão havia finalmente chegado e era hora de ir para o acampamento.

Quando cheguei, após uma viagem de quarto horas, eu estava muito empolgado. Era uma viagem nostálgica, relembrando todos os meus lugares favoritos. Mas uma coisa de cada vez, minha mãe precisava me levar ao alojamento para me inscrever. Chegando lá, havia muitas pessoas. Esperamos na fila até ser a nossa vez de nos inscrevermos. Antes que nos fossem entregues os papéis, a recepcionista nos contou que haviam ocorrido algumas coisas estranhas a algumas milhas dali, na direção da floresta. Eu meio que ignorei isso.

Minha mãe me ajudou a levar as malas para a cabana. Quando chegamos lá eu estava tão feliz por ver alguns amigos do ano passado. Kyle, um dos meus amigos de longa data do acampamento, estava em um canto arrumando sua cama. Jacob, outro dos meus bons amigos, estava no chão, desfazendo sua mala. E quem poderia esquecer do Brad? Ele estava guardando coisas no armário, como tacos de baseball e de golfe. Quanto às outras crianças, não fazia idéia de quem eram, mas ambas pareciam ter gostado de mim. Descobri que eles eram irmãos, e seus nomes eram Brandon e Nathaniel, e como esse era seu primeiro ano, eles estavam um pouco nervosos. Todos arrumamos nossas coisas e começamos a conversar sobre aventuras passadas no acampamento.

Só depois de uma hora foi que o líder da nossa cabana chegou. Quando ele entrou, olhou pra nós com uma cara meio sombria.

Ele se virou e disse "Olá garotos, serei o líder da sua cabana pelas próximas semanas. Antes de qualquer coisa, devo dizer que algumas coisas mudaram e que teremos que ser mais cuidadosos devido às coisas estranhas que vem acontecendo."

Todos estavam meio desconfortáveis, mas não poderíamos deixar que isso nos impedisse de ter o melhor verão de todos. O dia seguiu normalmente: nos apresentamos, jogamos baralho na nossa cabana, fomos lá fora e jogamos basquete, fomos comer no saguão bagunçado e voltamos para a cabana para dormir. Foi meio estranho que houvesse apenas seis cabanas cheias de gente, normalmente havia cerca de trinta.

Quando acordamos no dia seguinte, estava chovendo bastante. O som da chuva batendo no telhado de metal da cabana ecoava à distância. Ninguém sabia onde o líder do acampamento estava. Nós, crianças, meio que sentamos no meio da cabana, esperando nosso líder voltar. Começamos a contar histórias de fantasmas que ocorreram pelo acampamento. Algumas delas pareciam totalmente estúpidas, mas algumas até que eram assustadoras. Fora da cabana havia cerca de 400 acres de floresta. Nessa floresta havia algumas trilhas com obstáculos, a capela e o rio. Existia mais uma coisa na floresta, que ninguém mais conhecia porque ficava muito afastada. Eram as cabanas originais do Acampamento Rock Water. Só alguns dos líderes conheciam essas cabanas e sabiam como chegar até elas. Supostamente, lá pelo ano de 1900, quando o acampamento foi estabelecido, duas crianças brigaram dentro da sua cabana. Uma criança matou a outra enquanto ela dormia. Ele aparentemente pegou uma pedra pesada e a largou sobre a cabeça do outro garoto. A lenda diz que a presença do garoto morto ainda está à espreita pelo território das velhas cabines e da capela. Alguém até disse que foi até as cabines e viu sua cabeça espiando por uma das janelas.

Nesse ponto, todos na nossa cabana estavam realmente assustados. Eu pude jurar que Brad teve um ataque de pânico. Nosso líder entrou correndo pela porta. Ele disse que precisávamos arrumar nossas coisas e ir para o saguão. Ele ligaria para nossos pais para virem nos buscar de manhã. Nós caminhamos a distância entre a cabana e o saguão debaixo de chuva, encharcando as nossas coisas. Quando chegamos lá, somente outras quatro cabanas estavam presentes. Eu estava sentado perto da lareira com meus colegas de cabana e nós ouvimos pessoas conversando sobre o que estava acontecendo. Alguém tinha dito que toda a cabana seis havia desaparecido após retornar da capela.

Mais tarde naquela noite eu acordei todos os meus amigos. Eu queria ver o que tinha acontecido na floresta. Apesar de hesitarem um pouco, eles concordaram em me acompanhar. Pegamos algumas lanternas e passamos escondidos pelos líderes das cabanas, que dormiam perto da saída. Quando saímos ainda estava chovendo. Mas agora estava puro breu lá fora. Isso não nos impediu de seguir para o bosque.

Quando nosso grupo finalmente chegou à boca da floresta, Brad e Jake não conseguiam mais. Eles voltaram tristes para o saguão, através do atalho nos jardins. Os que restaram eram Kyle, Brandon, Nathaniel e eu. Nós caminhamos lentamente pelo caminho estreito até a capela. De vez em quando tropeçávamos em uma raiz saliente, mas seguimos em frente.

Nós podíamos ver a capela logo à nossa frente, mas havia algo errado. Estava muito quieto. A chuva havia parado. Não havia vento o qualquer tipo de animal à vista. Conforme andamos na direção da capela, Brandon (que estava segurando uma das lanternas) começou a gritar. Ele correu o mais rápido que pôde na direção do acampamento e derrubou sua lanterna. A luz apontava para a capela e por uma das janelas iluminadas nós vimos o rosto de uma criança, chorando. Todos nós gritamos e corremos de volta para o acampamento. Devido ao medo, perdemos todo o senso de direção e não fazíamos idéia de onde estávamos. Chegamos ao barranco que levava ao rio. Havia uma pequena figura negra bloqueando nosso caminho. Nossa única saída era descer pelo barranco. Nathaniel, Kyle e eu começamos a descer pela lateral da ravina e notamos outra figura, mas era um dos nossos. Eu apontei minha lanterna para baixo e lá estava Brandon, jazendo morto, com sua cabeça esmagada e sangue por todo lado. Ele deve ter tropeçado em alguma raiz e caiu pelo barranco. Mas nós tínhamos que continuar correndo.

Já tínhamos descido metade do caminho. Podíamos sentir o suor escorrendo nos olhos como água do mar. Lá estava ele de novo, a figura de um garoto parado no pé da ravina, nos esperando para "brincar" com ele. Eu disse a todos para continuar correndo. Eu olhei para trás e Nathaniel não estava lá. Desapareceu completamente. Kyle e eu vimos à nossa esquerda as escadas que levavam aos fundos do acampamento. Quando chegamos às escadas e estávamos quase no topo, podíamos ouvir uma criança dizendo "nós podemos brincar com pedras!". Nós não paramos para olhar para trás. Quando chegamos, todos os líderes estavam acordados. Duas outras cabanas haviam saído para "investigar" o que estava ocorrendo na floresta. Ambas estavam desaparecidas. Kyle finalmente falou. Ele não tinha dito nada a noite inteira, até agora.

"Eu o vi, o garoto só queria brincar com a gente."

Anos se passaram desde aquele encontro. Kyle foi mandado para um hospital psiquiátrico devido ao sério trauma. Jake e Brad foram encontrados enterrados sob a capela depois que a demoliram. Seus corpos foram cortados. As mãos foram decepadas e colocadas em um pequeno baú perto deles. Mas quanto às crianças das outras três cabanas, ninguém jamais descobriu o que aconteceu com eles ou pra onde foram. Talvez eles simplesmente não dessem a mínima.