Edgar ergueu a cabeça. Tinha as costas
pressionadas firmemente contra o encosto de sua poltrona favorita, e seu corpo
estava encharcado de sour. Ele encarou as trevas no canto da sala de estar, com
os olhos lacrimejando, enquanto apontava, lenta e deliberadamente, um revólver
para sua têmpora. "Dezessete", ele sussurrou para a escuridão.
O dedo indicador de sua mão direita já
havia encontrado seu lugar no gatilho enquanto a arma era erguida. Ele não
havia hesitado mais do que um segundo e sua única preocupação era se certificar
em encontrar um ângulo realmente fatal. Ele cerrou o punho esquerdo, reforçando
sua determinação. Ele inspirou bruscamente. E sem mais necessidade de ar ou
vontade, ele cerrou o punho direito.
As trevas mudaram para uma luz
brilhante a partir do barril da .38 Special, conforme o estampido do tiro ecoou
pela sala. Os restos de Edgar Freeman caíram de lado no que um dia fora sua
poltrona favorita. O outro homem com ele naquele cômodo sorriu suavemente.
Aquele que estava nas sombras, sendo brevemente iluminado pelo clarão, aquele
homem pálido de terno, com olhos azuis desbotados. Ele sorriu conforme tudo
ficou cinza. Edgar se sentou na cama, arrancando as cobertas, como sempre fazia
toda manhã depois de acordar daquele maldito pesadelo. Após a quarta noite
seguida tendo o mesmo sonho, ele começou a dormir com o abajur ao lado de sua
cama aceso. Depois da sexta noite em seqüência, sua ânsia em acordar acabou por
derrubar esse abajur no chão – lâmpada espatifada e luminária rachada pelo
impacto. Esta tinha sido a oitava noite, e enquanto xingava de todos os jeitos
que podia se lembrar na escuridão de seu quarto, ele jurou que hoje iria
encontrar tempo para comprar uma caixa de lâmpadas.
Evocando sem querer o sorriso
inapropriadamente doce do estranho no sonho, ele se lembrou de pedir ao
funcionário pelas lâmpadas de maior voltagem. Depois de um banho quente e
alguns minutos organizando os pensamentos na beirada da cama, Edgar se preparou
para aquele dia. Ovos mexidos quase sem gosto e um café que seria muito melhor
se não tivesse gosto de nada compuseram seu café da manhã, e seus pensamentos
divagaram sobre como o café da manhã preparado por Haley seria absurdamente
melhor. Independente dos outros problemas que eles tinham, as habilidades
culinárias de Haley eram irrepreensíveis. Ele regularmente acordava com o
cheiro delicioso de um café da manhã nutritivo que ela preparava para ele –
normalmente ovos fritos com bolinho inglês e um grande copo de suco de laranja
– pelo menos até que os enjôos matinais começaram, mantendo-a ocupada em suas preces
para a deusa de porcelana pela primeira hora de todos os dias. Tudo isso, ele
se lembrou amargamente, estava no passado agora.
Sendo o Vice-Presidente de Marketing da
segunda maior empresa de moda esportiva do país (e, conforme sua
opinião sobre si mesmo, um homem atraente), Edgar estava mais do que
acostumado a flertes ocasionais – tanto sutis quanto agressivos –
de estagiárias e colegas de setor. Isso veio com o cargo, mas nunca
foi algo com o qual ele não conseguisse lidar. Pensamentos sobre
levar um flerte adiante ou denunciá-los para o RH raramente cruzavam
sua mente. A primeira opção era descartada pelo pensamento de sua
esposa grávida, e a segunda devido à massagem no ego que o flerte
proporcionava. No entanto, um mês atrás, Edgar começou a ter um
caso com uma estagiária particularmente gordinha, chamada Samantha.
Ela não tinha nada de especial. Só um corpo quente para saciar a
vontade que Haley não queria ou não podia atender depois de entrar
no terceiro trimestre. Até o sexo era trivial.
O primeiro encontro teve lugar em um
motel a alguns quarteirões do escritório. O tipo de lugar com
janelas com vista para rodovias e acessos nada bonitos, onde até as
baratas usam luz negra antes de rastejar por baixo da cama. Como uma
tentativa para dar legitimidade ao lugar, o estabelecimento havia
parado de anunciar o preço por hora – um fato conhecido, pois
Edgar perguntou a respeito quando entrou.
Após o primeiro encontro, os dois
ficaram mais ousados e menos cautelosos em suas indiscrições. O
escritório de Edgar foi o próximo, e dessa vez havia sido um pouco
mais satisfatório – uma combinação de perigo e a saia que
Samantha deixou vestida, a pedido dele. Mas ousadia rapidamente se
transformou em descuido, e Edgar era um aprendiz de infiel menos de
duas semanas antes de Haley descobrir sua traição.
Talvez tenha sido um cheiro ou perfume
estranho, ou uma ligação de alguma rejeitada invejosa que tenha
visto os dois juntos no escritório. O fato é que não demorou muito
até que Edgar tivesse que encarar a questão de seu adultério com
Samantha assim que chegou em casa. Ele foi acusado no momento em que
atravessou a porta. Edgar havia chegado tarde de um rompante
particularmente selvagem com Samantha, e as palavras saindo dos
lábios trêmulos de Haley rapidamente revelaram o quanto ela sabia.
Seria inútil mentir – ela sabia de
muitos detalhes e ele tinha muito pouca imaginação – então Edgar confessou, e
fez um esforço superficial para justificar seu comportamento. Ela o xingou com
uma intensidade que Edgar nunca viu antes, e suas palavras finais deixaram
claro que ela estava indo embora e que iria garantir que ele jamais teria
qualquer participação na criação de seu filho. Apesar da angústia de perder
Haley, Edgar havia passado muito tempo em um ramo de negócios impiedoso para
simplesmente encarar ameaças de forma passiva, até mesmo de sua esposa. Ele riu
amargamente, e a lembrou da qualidade dos advogados que seu dinheiro poderia
pagar. Quando ele terminou, havia dito palavras das quais tinha se arrependido
instantaneamente, mas se viu em um silêncio impotente. Disse que ela teria
sorte se conseguisse passar os fins de semana e alguns feriados com a criança.
Isso era mentira e ele sabia, mas
naquele ponto a idéia era sair da defensiva e recuperar a vantagem na discussão
– talvez até mesmo fazer com que Haley reconsiderasse sua decisão de ir embora.
Ele assinaria alegremente alguns cheques robustos para um conselheiro
matrimonial se isso o livrasse de assinar alguns ainda maiores na forma de
pensão alimentícia. Mas algo na forma como Haley sorria pra ele indicava que
ele não havia entendido suas intenções. E quando ele percebeu, era tarde
demais. Se ele tivesse sido mais atento, teria notado o gancho vazio no porta
chaves e o teria conectado àquele sorriso sarcástico no rosto dela.
Ela não saiu logo em seguida, como ele
esperava. Não era assim que funcionava nos filmes e na televisão? O cara
voltava do banheiro ou do bar, um tempo depois da briga, pra encontrar a mala
da garota arreganhada e entupida com todas as roupas caras que ele comprou pra
ela durante o relacionamento? Com ela orgulhosa e ele prostrado e implorando?
Edgar jamais agiria dessa forma em sua
vida, mas esperava isso de Haley. Ao invés disso, uma hora depois de ele ter
abandonado a discussão para tomar um banho bastante necessário, ele olhou para a
sala de estar, apenas para encontrá-la sentada em sua poltrona favorita (que
vadia), olhando para o vazio e acariciando sua barriga grávida (Minha nossa,
ela está pronta pra parir).
No que dizia respeito a Edgar, aquele
era o fim da primeira de supostamente muitas discussões a respeito desse
assunto. Ele desceu as escadas em silêncio e deitou na cama. O dia havia sido
longo o suficiente e ela claramente não iria a lugar nenhum, senão já teria
saído. Haley nunca foi para a cama, mas ele também não ouviu a porta da frente
bater atrás dela antes dela partir – então pareceu que ela decidira ficar pelo
menos por essa noite. "Tudo ficará bem", Edgar disse a si mesmo,
conforme ficava sonolento. "Mas duvido que ela prepare meu café da manhã
por alguns dias".
O ruído que o arrancou de seu sono
profundo veio logo depois das cinco da manhã, de acordo com seu despertador. Quando
ele finalmente despertou, o som tinha sumido tão rápido quanto tinha surgido.
Ele parou, refletindo, e vasculhou a cama, com olhos tão sonolentos que mal
conseguiam realizar essa simples tarefa. Percebendo que o lugar de Haley estava
vazio, Edgar abriu a porta do quarto e desceu as escadas para descobrir o que
tinha causado o barulho.
Ele nem precisou chegar ao fim das
escadas, nem deixar seus olhos se ajustarem, para perceber que ela havia
decidido mesmo deixá-lo. Uma olhada na sala de estar tirou qualquer dúvida a
esse respeito. Não havia malas abarrotadas nem olhares orgulhosos – só uma
estante de armas aberta, uma mancha rubra na parede e um gotejamento constante
da mesma cor, pingando pelo lado de sua poltrona favorita e fazendo uma poça no
chão de madeira polida.
Após um momento de choque paralisante,
Edgar se arremessou rumo ao telefone, com passos largos e desesperados. A
rapidez não era pelo bem de Haley, pois através de seu crânio recém aberto dava
pra ver claramente alguns trechos do debate presidencial que estava sendo
televisionado, do outro lado da sala. A pressa era por seu passageiro inocente
de sete meses e meio. Ele deu todas as informações pertinentes para o operador de
atendimento absurdamente indiferente da emergência, e esperou no corredor, com
a porta da frente escancarada.
O tiro tinha atraído uma multidão de
vizinhos madrugadores para a entrada da garagem da residência dos Freeman, um
fenômeno gerado não pela bravura perante o perigo, mas sim pela ignorância
comum diante dele. Ignorância essa reservada exclusivamente aos bairros
habitados pelos ricos e bem abrigados. Eles o encaravam acusatoriamente, com,
no mínimo, um princípio de desconfiança no olhar. Edgar ficou furioso com eles
por isso. Primeiro com pensamentos enraivecidos, depois com rosnados guturais e
uma impotente agitação. Eles davam um passo coletivo para trás quando sua fúria
e frustração cresciam, e avançavam novamente quando os gritos diminuíam em
ferocidade – uma onda humana de observadores boquiabertos.
O espetáculo foi temporariamente
dispersado pela sirene e subseqüente surgimento da ambulância, cujos
paramédicos surgiram apenas alguns minutos depois da ligação de Edgar (outra
característica exclusiva do tipo de vizinhança onde Edgar e Haley Freeman
moravam). A multidão abriu espaço para os veículos de emergência, mas logo
achou outro ponto de observação na grama de Edgar. Os paramédicos encontraram a
esposa de Edgar caída sobre sua poltrona e amarraram seu corpo sem vida em uma
maca. Assim que ela estava segura, eles a tiraram rapidamente da casa e a
colocaram na ambulância. Edgar pulou pra dentro também, e não houve tempo de
fazer nem responder perguntas antes que os funcionários batessem a porta e
disparassem rumo ao hospital.
Entre checagens de sinais vitais e
tentativas de bombear oxigênio no cadáver de sua esposa pelo bem do nascituro,
Edgar notou olhares cautelosos sendo jogados em sua direção pelos paramédicos –
bem como as luzes azuis de vários veículos da polícia seguindo a ambulância de
perto. "Eu não tive nada a ver com isso", ele queria dizer – queria gritar
– mas no fundo de sua mente ele sabia que isso estava a apenas um ou dois
passos de ser totalmente verdade, então ele permaneceu em silêncio.
Ele achou que seria algemado assim que
chegasse ao hospital, mas ao invés disso o grupo de oficiais da polícia
simplesmente disse que eles iriam esperar com Edgar enquanto os médicos faziam
o que podiam para salvar o bebê – e talvez conseguir alguma informação com ele,
se ele resolvesse falar. Edgar fez um aceno, concordando, principalmente porque
os agentes davam sinais de ter a intenção de arrancar informações dele
independente de ele estar a fim de falar ou não.
Eles ficaram do lado de fora da sala de
operação, enfileirados na área de observação. Os policiais deram espaço para
Edgar. Seu rosto estava a alguns centímetros do vidro, fazendo pausas
ocasionais para limpar o vidro com sua manga, após respirações frenéticas o
deixarem opaco. Eles o questionaram hesitantemente. Ele os respondeu
rispidamente e sem se importar com as palavras que usava. Suas preocupações
estavam em outro lugar e ele sabia que não havia nada que ele pudesse deixar
escapar que fosse incriminá-lo. Ele assistiu enquanto o cirurgião fez uma
grande incisão no baixo-ventre de Haley (pelo menos ela está anestesiada pra
isso, Edgar pensou, insanamente) e se preparou para remover a criança de seu
útero.
Após alguns minutos, todos na área de
observação sabiam tudo que precisavam saber. Os policiais sabiam que Haley
aparentemente havia morrido pelas próprias mãos (a autópsia iria confirmar ou negar
isso), e que havia feito isso por causa da infidelidade de seu marido, e que
Edgar não havia reparado em nenhum sinal que antecedeu o suicídio. Edgar, por
sua vez, sabia que o bebê estava vivo, mas morrendo, sabia que o bebê era um
menino (eles queriam que o sexo da criança fosse surpresa, uma das coisas com
as quais ele e Haley nunca discordaram), e sabia que o bebê estava sendo colocado
em uma incubadora, como um esforço de última hora para salvar sua vida.
Edgar ficou do lado de fora da sala,
com a polícia agora mantendo uma distância ainda mais respeitosa conforme ele
assistia ao seu filho morrer. Havia pouca comoção em relação a isso, e pouco
que os médicos pudessem fazer para evitar. Os olhos da criança se abriram uma
única vez durante todo o tempo, e a próxima coisa que Edgar sabia era que
estavam anunciando a hora da morte como sendo 5h46. Eles o separaram de Haley
às 5h29, Edgar pensou freneticamente. Minha criança - meu filho – estava vivo a
menos de uma hora atrás. Eu nem tive tempo de dar um nome a ele. Essa era a
promessa que fizemos, já que não conseguíamos concordar nem na porcaria do
nome. Edgar socou a parede, e sentiu uma vaga sensação de seu punho se
quebrando. Conforme ele caía sobre seus joelhos, sua mão doía bem menos do que
as lágrimas escaldantes que jorravam de seus olhos
Isso foi há duas semanas. Hoje, Edgar
comeu ovos quase sem gosto e bebeu café que seria melhor se nem tivesse sabor. Oito
noites ele viveu com o pesadelo de se matar destruindo qualquer resquício de
sono. Oito noites agora ele viveu com o homem nas sombras de um pesadelo,
sorrindo com sua decisão de tirar a própria vida. Lâmpadas, uma caixa bem
grande delas, a maior voltagem disponível na loja, hoje depois do trabalho. Edgar
lembrou-se novamente dessa incumbência enquanto vestia a jaqueta e saía pela
porta.
O trabalho correu como sempre, exceto pela distração adicional e pela capa
mórbida do filtro de água, providenciado pelo suicídio de sua esposa. Era
incômodo, mais do que tudo.
Edgar primeiro se tornou consciente de
uma forma humana, parada do lado de fora da porta do seu escritório, quando
olhou para o relógio para determinar quão longe na noite ele havia se perdido
em papeladas. Ele chegou no trabalho na alvorada, e certamente já era
crepúsculo, no mínimo. O dia havia sido típico da volta de um colega de luto –
banalidades insignificantes e simpatia falsa, palavras vazias de corações
vazios, de pessoas pagas para fingirem que se importam, mas não pagas o suficiente
para fingir de forma convincente. Não dá pra dizer exatamente quanto tempo o
homem silencioso ficou parado nas trevas do corredor, mas Edgar recordou da
primeira sensação vaga de estar sendo vigiado, alguns minutos atrás. Todos,
exceto os guardas do turno da noite, já tinham ido embora horas atrás, dando a
ele uma trégua de boas-vindas na qual ele poderia se concentrar e recuperar o
trabalho perdido. Ou foi isso que ele pensou, até essa nova interrupção.
“Olá?” Edgar hesitantemente
cumprimentou o intruso, já esperando pelo próximo em uma longa fila de pessoas
péssimas para dar consolos emocionais. “Boa noite, senhor”, a resposta veio,
dissonante e áspera. Seus olhos ainda tentavam se adaptar à mudança drástica da
iluminação de seu escritório para o corredor, iluminado apenas pelo luar
vazando por algumas janelas bem espalhadas. Edgar achou que, pela voz
desconhecida, poderia ser um estranho – um vendedor, talvez – ou um colega com
alguma gripe bem séria, que não deveria estar espalhando-a por aí.
“Entre aqui, eu estou com os olhos
manchados de tanto olhar pra essa lâmpada pelas últimas duas horas, não consigo
enxergar nada aqui fora.”
“Realmente não posso ficar”, o homem
entonou, praticamente gorgolejando, “só estou de passagem”.
“É, sei o que quer dizer. Já passou da
hora de se demi... nós nos conhecemos?” Os olhos negros de Edgar começaram a se
adaptar, e ele ficou desconfortável. O estranho ainda estava difuso e borrado,
mas claramente usava um terno preto de algum tecido irreconhecível. Mais um
minuto e ficaria claro se ele era algum tipo de auditor interno durão do 14º
andar, ou outro detetive fuçando por aí depois da morte de Haley. Quem quer que
fosse, o terno o fazia parecer um estranho. As sextas feiras no trabalho eram
sempre um Dia Casual, quando até os Executivos Senior usavam camisas polo e
caqui. O homem não mostrava sinais de que iria embora, então Edgar forçou seus
olhos para determinar se ele possuía um daqueles crachás de acesso ridículos
que eles tinham que usar pelo prédio.
“Sou novo. Sou um mensageiro. Estou
aqui para entregar uma encomenda.”
Edgar ergueu a cabeça, duvidoso. Um
entregador usando um terno completo? Tenta outra. E sem crachá. Edgar não
respondeu, esperando que o estranho (escriturário? Testemunha de Jeová?) voltaria
para seus assuntos e iria embora.
“Você trabalha por tantas horas. Você
não sente falta de sua família, senhor?”
Um nó se formou na garganta de Edgar, e
ele se endireitou na cadeira. Passado o choque inicial, Edgar relaxou um pouco
a postura, rapidamente e se convencendo da natureza inofensiva da pergunta. Um
representante do sindicato dos trabalhadores – claro. Ele entrou aqui para
tentar fingir uma simpatia delicadamente formal, tagarelar sobre horas extras
não remuneradas e crianças indo dormir sem a companhia dos pais. Só para tentar
nos induzir a abolir a cláusula contra sindicalização dos trabalhadores das
fábricas. “Eu recebo uma bela recompensa pelo trabalho que eu faço, assim como
todos os meus colegas. Então, não, estou bem, de verdade. Obrigado.” Isso deve
pôr um fim nisso, ele pensou, com certa satisfação maliciosa.
“Oh. Sinto muito em ouvir isso. Bem...”
O estranho virou-se suavemente, como se fosse embora, fez uma pausa, e inclinou
sua cabeça para dentro do escritório pela primeira vez.
“Eles certamente sentem sua falta.”
As palavras atingiram Edgar como gelo
afiado na espinha, apertando seu crânio com tentáculos tão gélidos quanto uma
tumba. O rosto sumiu tão rápido quanto havia aparecido – assim como a silhueta
do homem – mas a visão horrenda permaneceu cauterizada na mente de Edgar, e nas
profundezas de seu ser, ele sabia que a imagem permaneceria ali até o dia de
sua morte. Os olhos eram de um azul leitoso, tão distante e pálido que pareciam
cegos, mas encararam Edgar com um olhar tão penetrante que o convenceram de que
aqueles olhos enxergavam muito bem. Já o resto da face não exibia tais sinais de
vitalidade. Sua pele era pálida e macilenta e, mesmo à distância, apresentava
uma textura semelhante à de couro usado. As bochechas e órbitas dos olhos
estavam fundos no rosto, com a pele pendendo desses lugares, ainda que firme na
testa e ao redor a boca. Magro e cadavérico, cada detalhe, desde o cabelo
seboso e emaranhado, até os músculos trêmulos quando ele falava, era idêntico
às características do estranho sombrio dos pesadelos recentes de Edgar. Mas todo
o resto era irrelevante se comparado ao terror absoluto que ele sentiu ao ver
aqueles malditos olhos. Havia algo estranhamente familiar neles, algo terrível
que ele não conseguia nomear ou explicar.
Assim que recobrou o controle de seus
membros paralisados, Edgar disparou na direção da porta onde o homem estava
momentos atrás. O elevador ainda não havia chegado, e ele ainda não tinha escutado
o ruído típico da porta das escadarias, audível cada vez que ela era aberta ou
fechada. “Ele ainda está neste andar”, Edgar pensou, freneticamente. A ideia
deu a ele forças, mas não muita clareza ou propósito. Ele sabia apenas que
precisava confirmar se a presença do estranho era mais do que um mero resultado
de sua mente sobrecarregada e consciência pesada. Não sobrou nenhuma mesa de
escritório, cabine de banheiro ou armário que não tivesse sido revistado por
Edgar quando sua busca atingiu o ponto mais tenso. Pôsteres motivacionais
colados nas paredes, com empresários gentis demais e totalmente suspeitos,
sorrindo e apertando as mãos, pareciam zombar dele. Conspirando silenciosamente
contra Edgar em sua busca. “Claro que sabemos quem ele é e para onde ele foi”,
Edgar podia imaginá-los dizendo, “mas estamos ocupados demais alavancando nossa
energia e nos empenhando em processos de mais-valia para dialogar sobre sua
iniciativa”. Ele passou ambas as mãos pelos cabelos, agarrando alguns tufos e
os puxando levemente. Seu visitante, se é que era algo mais do que uma ilusão,
havia partido sem ser visto nem ouvido. Edgar podia sentir seu coração batendo
violentamente, parecendo se chocar contra sua caixa torácica. Ele parou apenas
para pegar sua maleta antes de correr escada abaixo para escapar do vazio
extremamente opressivo do escritório.
O estacionamento executivo não tinha
janelas, e por isso era ainda mais escuro de que o prédio dos escritórios. Estava
deserto, exceto por ele e seu Lexus, e estava assim desde que o segurança
terminou sua última ronda noturna, horas atrás – o guarda havia desligado todas
as luzes, exceto a que sinalizava a saída. Apesar dessa pequena segurança,
Edgar se viu lançando olhares furtivos sobre os ombros, e acelerando o passo
sempre que não havia razão nenhuma para fazê-lo. Ele nunca foi um homem
supersticioso, e o medo de monstros já estava enterrado há muito tempo atrás
pelos horrores ambulantes que caminham entre os homens em plena luz do dia. Empréstimo
educacional, seguros, demissões, pagamentos de hipoteca – vida. Edgar aprendeu,
décadas atrás, sobre presas e garras que fazem vampiros e lobisomens parecerem
brincadeira de criança. E ainda assim, repreendeu a si mesmo enquanto
procurava, desajeitado, por suas chaves. Só é necessária uma cutucada na
imaginação para despertar aquele terror primordial – para povoar a escuridão
vazia com coisas que não deveriam existir.
Ele estava a um metro e meio de seu
carro e havia acabado de destravá-lo com o controle remoto quando ouviu o
grito. Era estridente, feminino, aterrorizado, e tinha vindo dos escritórios
logo atrás dele. “Será que a Haley gritou assim logo antes de puxar o gatilho?”
Edgar pensou. Ele parou onde estava, deu meia-volta rapidamente e não viu nada.
Então, como em resposta à sua pergunta silenciosa, veio o tiro. Edgar apanhou
rapidamente o celular de seu bolso, discando 192 freneticamente pela segunda
vez em algumas semanas. Ele aproximou o telefone do ouvido, mas o atendente
parecia extremamente distante. Entretanto, o estalido de passos, vindo dos
escritórios na direção do executivo, pareciam bem próximos. Edgar largou o
celular e praticamente mergulhou em seu carro. Seu pé estava no acelerador tão
rápido quanto ele conseguiu engatar a marcha. As estradas do lado de fora do
escritório estavam iluminadas unicamente por luzes das ruas e o flash ocasional
de um carro no sentido oposto. O sol já havia desaparecido no horizonte horas atrás
– quando as pessoas de cáqui ou saias compridas pararam de fingir que se
importam com os problemas uns dos outros e deixaram Edgar sozinho com duas
semanas de papelada atrasada. O estresse, Edgar tentou convencer a si mesmo,
pode te fazer ver coisas. O estresse, ele
racionalizou, pode te fazer ouvir coisas. Trauma emocional. Mas nada disso fez
com que a pressão em sua mente diminuísse, nem a pressão no pedal, enquanto ele
acelerava rumo à sua casa.
Durante sua chegada afobada, Edgar
sabia que algo estava errado antes mesmo de entrar pela porta da frente. Ele não
desligava nenhuma luz desde que os pesadelos começaram, muito menos quando ele
esperava chegar em casa muito depois do pôr do sol. E mesmo assim, ele se viu
tropeçando no corredor, tentando acender as luzes. Quando suas mãos cegas
finalmente encontraram o interruptor, não foi muito surpreendente perceber que ele
estava quebrado – de acordo com os acontecimentos do dia, seria uma surpresa
maior se ele estivesse funcionando bem. O instinto dizia para que ele desse
meia volta e fugisse da casa, mas o número 1 piscando em vermelho na sua
secretária eletrônica o atraia com uma urgência ainda maior.
A despeito das suas mãos estarem
tremendo de ansiedade, Edgar apertou o botão Play com uma precisão absurda, um
movimento que ele desenvolveu muito bem durante as duas últimas semanas. Pessoas
com quem ele não falava e nem pensava a respeito desde antes de conhecer Haley
aparentemente não tinham se esquecido dele, e passaram todo esse intervalo de
tempo, desde a morte dela até agora, ligando para oferecer seus sentimentos. A preocupação
deles servia apenas para piorar a sensação de culpa a cada mensagem – o que ele
fez para merecer amigos tão leais? Ele já previa outra dose do mesmo consolo,
quando uma das últimas vozes que ele esperava ouvir emanou da secretária
eletrônica.
“Edgar?” a voz, geralmente tagarelante,
estava tingida com um inconfundível tom de preocupação.” É a Samantha. Eu sei
que não deveria estar te ligando. Provavelmente sou a última pessoa do mundo de
quem você quer ouvir falar, e eu nem consigo descrever o quanto eu sinto muito
pelo que aconteceu”. Houve uma pausa e o que pareceu um choramingo. Edgar pensou
que essa era possivelmente a emoção mais verdadeira que ele tinha ouvido de
Samantha desde que eles se conheceram. “Desculpe por tudo, de verdade. Eu... nós… nós não podíamos saber como
isso ia terminar. Mas eu sei que não tenho o direito de ligar. Só estou
preocupada com você, só isso. Eu faltei no trabalho hoje porque soube que você
estava voltando e pensei que você não merecia me ver, além de ter que lidar com
tudo mais... Eu só consigo imaginar o quão difícil deve estar sendo pra você
agora... e pra falar a verdade, eu estava com medo de te ver. Com medo de você
apontar pra mim cada vez que alguém te perguntasse alguma coisa, ou algo assim...
Eu sei, é estúpido. E egoísta. Mas eu passei no
escritório agora há pouco pra pegar alguns trabalhos e levar pra casa, e vi seu
carro estacionado na garagem.
Edgar viu a hora da mensagem na
máquina. Ela havia ligado em algum momento entre o fim de sua busca desenfreada
pelo escritório e antes de ele ter chegado no seu carro. O que significa que
ela estava lá bem na hora em que...
A voz na secretária continuou falando,
e Edgar estava agora escutando com mais atenção do que nunca, com os punhos
ficando brancos de tanto apertar o balcão da cozinha.
“... vi que a luz do seu escritório
estava acesa, mas você não estava por perto. E cara... parece que um tornado
atingiu esse lugar. Alguém realmente deu a louca aqui. Eu logo pensei em você,
então é por isso que estou ligando. Não sei se é tarde demais, ou se eu deveria
ter sumido por um tempo e procurado outro emprego e não ter te ligado mais, ou
sei lá... quer dizer, o que é apropriado fazer agora? Eu nunca vou poder
consertar as coisas, mas... eu realmente sinto muito Edgar. Por favor me ligue
de volta assim que ouvir essa mensagem. Eu sinto falta...”
“Falta” foi a última palavra
pronunciada por Samantha – a menos que um grito de congelar o sangue conte,
seguido por um barulho que silenciou tudo o que poderia ter vindo depois. O tiro
ressoou como um trovão, e não perdeu nada em potência do celular de Samantha
para a secretária eletrônica de Edgar. O silêncio que se seguiu era
ensurdecedor, e Edgar parou na frente da secretária, curvado e encarando-a
intensamente – como se ele esperasse que a máquina desse pistas visuais sobre o
ocorrido. Ao invés disso, ele obteve um áudio.
“Sentem sua
falta, sim. Você faz bastante falta, realmente.” A voz masculina, inegavelmente a mesma de
antes naquele dia, gargarejou enquanto ria. A máquina apitou, e um sólido zero
o informou que não havia mais nenhuma mensagen não ouvidas. Mas para Edgar
aquele zero representava muito mais do que isso. Era quase uma resposta para
não apenas quantas mensagens ele tinha, mas para cada pergunta relevante. O que,
por que, quem, como? O que resta, o que importa, o que o amanhã trará? Nada
além de zero, claro. Apenas uma negação vermelho-sangue.
Edgar soltou suas mãos do balcão e
tateou seu caminho pelas trevas da sala de estar. Ele passou por outro
interruptor no caminho, percebendo, sem interesse, que este estava quebrado
também. Então ele se recostou em sua poltrona favorita. “Eu tive”, Edgar
sussurrou no vazio da casa que jamais seria um lar novamente, “um mês bastante
difícil”. A resposta para essa frase aparentemente solta veio na forma de uma
risada a partir de um canto escuro da sala. Edgar sentiu cada músculo do seu
corpo se retesar, e ele perdeu totalmente o controle de sua bexiga. E não podia
se importar menos com isso. Ele apenas encarou as trevas e esperou pelo que
quer que fosse aparecer, enquanto o calor se espalhava pela frente das suas
calças.
O homem nas sombras deu um passo à
frente e Edgar estremeceu, afundando na cadeira tanto quanto conseguia. O estranho,
colocando de forma simples, ao invés de parecer que seus músculos estavam
prontos para abandonar essa prisão terrestre, aparentavam ter completado essa
missão. Edgar estava olhando para a face e o corpo de um homem que havia perdido
pedaços consideráveis de si mesmo. Como manteiga derretendo em uma sala quente,
alguns pedaços até caíram enquanto ele saía da escuridão.
“Eu sei que você deve estar pensando no
porquê de eu estar aqui, e porque nas últimas semanas sua vida saiu totalmente do
seu controle. Nesse ponto, é uma questão de Destino. Destino é como brincar de
cabo-de-guerra com um oponente muito mais forte do que você: às vezes dá até
pra sentir a corda vindo pro seu lado por alguns instantes, com seus pés firmes
no chão e seus esforços mais sinceros produzindo o resultado pelo qual você
tanto esperou, a vitória que você tanto merece. Mas mesmo quando você sente o
chão firme sob seus pés, sente que está no controle, isso é apenas o seu
oponente ajustando o aperto das mãos. Mas isso não impede o que você pode
chamar de livre arbítrio. As escolhas que as pessoas fazem é o que coloca o
Destino em movimento, e esses são momentos pivô.” Ele fez uma pausa, e em
seguida fez um adendo, “como você, alugando aquele quarto de motel. Muito pouca
coisa - e nenhuma consequência - esteve sob seu controle desde aquele momento. Sua
vadia está morta agora, e pela sua própria arma. O olho direito dela se parece
com o número na sua secretária eletrônic. Nada além de um grande zero vermelho. Nenhuma mensagem. Até o nascer do sol
você estará em uma cela. Sua esposa descobriu sobre você e a vadia há algumas
semanas. Talvez ela tenha tirado a própria vida, talvez você tenha desempenhado
um papel nisso. A vadia, no entanto... foi assassinada. Não há júri no mundo
que não considere sua culpa como uma conclusão precipitada.”
“Por que?” Edgar fez a pergunta
de forma desanimada, incapaz de exprimir emoção. Ele nunca tinha se sentido tão
cansado – tão completamente esgotado e vazio – em toda a sua vida. A cada
palavra que o homem pálido pronunciava, uma queimação enorme se propagava pelos
músculos de Edgar, e mesmo assim sua mente estava tão afiada quanto antes,
desesperada para encarar aqueles olhos que ele conhecia tão bem.
“Por que o que? Por que você se distanciou
da esposa que te amava? Não posso te ajudar nessa. Não que a resposta fosse
mudar alguma coisa para qualquer de nós. Mas esse não é o ‘por que’ mais
importante para você, é? Você quer saber por que isso está acontecendo com
você, por que eu estou fazendo isso. Mas por alguma razão está com medo de me
perguntar quem eu sou, e essa é a verdadeira pergunta por trás do ‘por que’. E eu
devo dizer que você é quem deve responder isso por nós dois.”
O estranho retomou sua lenta marcha em
direção a Edgar, de forma hesitante, enquanto cambaleava para mais perto. A mente
de Edgar estava profundamente imersa em si mesma, tentando recuperar a memória
de algo que ele tinha visto há muitos anos atrás, durante um passeio noturno
pelo estacionamento a caminho do trabalho. Uma mariposa despedaçada, caída na
base de um poste de iluminação. Qualquer legista sem dúvida teria dito que se
tratava de um caso agudo de cabeçadas em um pequeno sol elétrico de plástico. Então
veio uma brisa forte, que jogou a mariposa pelo ar, sacudindo e batendo asas,
cruzando o caminho de Edgar através do estacionamento. Quando a brisa se foi, a
mariposa voltou a ser um corpo totalmente em repouso. Assim como todas as coisas
mortas deveriam estar, pensou Edgar, a menos que haja a intervenção de alguma
força externa. Uma força invisível, no caso da mariposa. E, Edgar se lembrou
novamente, no caso do homem parado diante dele. Porque em seus movimentos Edgar
viu aquela mariposa claramente. Eram movimentos de algo que esteve vivo, mas
que agora era guiado por uma força invisível totalmente diferente. – uma força que podia apenas imitar de forma
aproximada os movimentos do recipiente que agora controla. O vento foi a força
que impeliu a mariposa de volta para uma versão distorcida da vida, mas qual
seria a força que poderia fazer o mesmo com um homem?
Após um momento de silêncio, que
pareceu se estender por horas, Edgar encarou os olhos pálidos e azuis do
estranho, com as últimas fibras de coragem que lhe restavam. ”Morte?” Então um
pouco mais seguro: “Você é a Morte.”
O estranho riu ruidosamente, e seu
corpo magro convulsionava com o ritmo de sua gargalhada seca e chiada. A carne
murcha de sua face se esticou, revelando gengivas negras e dentes brancos
demais, na imitação mais grotesca de um sorriso que Edgar poderia imaginar. Assim
que seu sorriso se desfez, o homem negro falou, enxugando lágrimas que não
estavam ali. “Você me entendeu errado. Não era minha intenção parecer sombrio. Eu
estava simplesmente pedindo que você me desse um nome. Esse corpo é uma aproximação.
É o corpo que eu teria, se tivesse vivido o suficiente para crescer até ele. Mas
os olhos, são a janela para a alma, é o que dizem, e eu esperava que você fosse
se lembrar da minha. Mas eu te
perdoo. Você só me viu por alguns momentos, e sob pressão. Mas você deveria me dar um nome. Morrer sem um nome foi a pior parte.”
Uma compreensão mais terrível do que qualquer
medo começou a brotar em Edgar, e um calafrio geral tomou conta dele. O homem
deu um tapinha gentil em seu ombro e se inclinou para perto, colocando dois
quilos de aço gelado na mão de Edgar. “Eu te disse que eu era um mensageiro, e
agora minha tarefa está cumprida. Mamãe me pediu pra te dar isso. Ela disse pra
se apressar. Ela prometeu não ser muito dura com você se você voltar pra casa
rápido.”
Edgar estremeceu, impotente. Seus olhos
começaram a lacrimejar e arder, procurando por qualquer sinal de consolo nos
olhos de seu filho. Ele moveu os lábios para falar, mas não encontrou palavras.
A resposta às suas súplicas silenciosas veio no tom mais compassivo que seu
visitante conseguia produzir. “Não é terrível aqui, é só...” A cabeça da
coisa-cadáver pendeu para o lado, com um olhar bastante infantil nos pálidos
olhos azuis. “Cinza. Lá é cinza. O tempo passa muito mais devagar, se é
que passa. Eles te mostram coisas. Eles me mostraram tudo que eu iria aprender
durante a vida que as suas ações me negaram.” Havia veneno na voz decadente
agora, e Edgar sabia que puxar aquele gatilho por conta própria seria a única
misericórdia que ele teria hoje.
O visitante se virou, tropeçando de
forma desajeitada de volta para a escuridão no canto da sala, enquanto Edgar
examinava o revolver carregado. Seu pretenso descendente tinha quase saído de
vista por completo, e falou sem nenhuma emoção detectável. “Mais uma coisa. Depois
que eles me cortaram, quanto tempo eu durei naquela incubadora? Ela não sabe,
mas achei que você saberia. Eu tentei meu melhor para segurar as pontas, mas
não deu pra aguentar muito. Quinze minutos?
Vinte?”
Edgar ergueu a cabeça. Tinha as costas
pressionadas firmemente contra o encosto de sua poltrona favorita, e seu corpo
estava encharcado de sour. Ele encarou as trevas no canto da sala de estar, com
os olhos lacrimejando, enquanto apontava, lenta e deliberadamente, um revólver
para sua têmpora. "Dezessete", ele sussurrou para a escuridão.